segunda-feira, 20 de dezembro de 2010

Boletim 62

ABRINDO A PORTEIRA.
Fazenda da Quinta 9ª.
Francisco Luiz ao participar da vida social de Camaquã iluminou sua intelectualidade, investindo na Gráfica Camaquense, fundadora do jornal "O Camaquã", tonando-se ali um de seus cronistas, com textos fortes na área política. Este é o jornal onde o NPHC busca a história de Camaquã, e que na época era o único da cidade. Já o Coronel Sylvio Luiz, com seu espírito aventureiro, projetou-se nas "canchas retas" de todo o Estado, onde nas patas de seus cavalos e no "perfume" de suas potrancas, jogou boa parte da fortuna da Fazenda da Quinta. Entretanto, homem de personalidade forte, e correto no trato de seus negócios, se fez amar por seus amigos e conterrâneos, projetando-se também na política municipal, tendo sido prefeito por duas gestões. Enquanto a Quinta era administrada por gerentes, eles se deslocavam regularmente até ela, por caminhos que ainda não eram estradas, buscando rumos que ainda hoje os fazendeiros não encontraram.


GALPÃO.
Meus ancestrais.
Já escrevi, que no Galpão do Galo Velho cultivamos a imagem da nossa ancestralidade, pendurada no quarto do "Vô Mário". Assim deixo a foto de meus quatro avós, e abaixo um poema de Apparício da Silva Rillo.










Vovô Ney Xavier Azambuja e vovó Fustina Pereira da Silva Azambuja, meus avós paternos. Na outra foto, vovô Adolfo Luiz Pereira da Silva e vovó Anna América Centeno da Silva, meus avós maternos.

Sucessão.
Ser não é ter sido, ou perceber-se na estampa dos retratos dos avós.
É estar além do vidro das molduras, numa projeção muito além do próprio ser.

Guardo armas no meu íntimo armorial, brasões de sangue do meu velho clã.
Minhas batalhas são as vésperas de hoje, na projeção imprevisivel do amanhã.

Ter sido não é ser, ou apegar-se ao veio e as raízes dos avós.
É ser a rama que brotaram deles, para dar sombra aos que virão de nós.


HISTÓRIAS QUE ME CONTARAM.
A morte do Compadre Tigre.
Das histórias do Compadre Tigre havia esquecido dessa.
-Uma certa feita, o Compadre Tigre, que só tinha violência no corpo procurou a Comadre Cobra, sua grande amiga e lhe disse: "Sabe Comadre achei uma maneira de pegar o maldito do Compadre Macaco. Tu vai espalhar na mata que eu morri, e que estou sendo velado aqui na minha gruta." Ele então se deitou num grande banco de pedra, enquanto a Comadre Cobra com a Comadre Hiena passaram a espalhar a notícia entre a bicharada. Os bichos não gostavam dele, mas por curiosidade foram ao velório. Convidaram então o Compadre Macaco, que chegando na entrada da gruta, muito desconfiado, mas muito inteligente perguntou alto: "Ele já deu o último pumm?" O Compadre Tigre ao ouvir a pergunta passou a se espremer. O Compadre Macaco concluiu: "Se ele não deu o último pumm é porque ainda está vivo", no que foi apoiado pela bicharada presente. Então, depois de muito esforço, o infeliz e burro do Compadre Tigre, soltou um grande pumm. Minha gente, foi uma correria porta à fora, e o Compadre Tigre saiu pega que te larga no bafo da bunda do Compadre Macado, que saltando numa árvore fez figa para ele dizendo: "Olha bandido e malvado, tu nunca vais me pegar". E o Compadre Tigre soltava fogo pelas ventas de tão brabo.


FECHANDO A PORTEIRA.
Ainda o Natal.
Com meu votos de SAÚDE, SAÚDE, SAÚDE, deixo para vocês a poesia de Apparício da Silva Rillo, intitulada "Natal".

-Fui apresentado à Papai Noel quando tinha três anos,
e já me considerava um cidadão do Mundo. Do meu Mundo, que era quintal com laranjeiras,
galo, galinha carijó, cachorro e uma reboleira de mato onde brincava com terra.

Papai Noel foi meu primeiro medo. O segundo, imenso, foi o de cair
pelo burraco de acento da casinha, e me afundar naquela massa escura lá no fundo.
Outros vieram depois, e muitos ainda me acompanham
com um diabo de guarda, comigo pelo Mundo.

Mamãe dizia que Papai Noel era bonzinho. Gostava muito de minha Mamãe,
mas não podia acreditar. Para me dar um aviãozinho vermelho duas asas,
Papai Noel passou-me um sermão maior do que suas barbas,
só porque eu matara um pinto, afogado na bacia d`água.

O aviãozinho despertou-me, pois foi depois dele que associei Natal,
pinheirinho, presépio, missa do galo, peças de um estranho ritual,
que se armava a cada ano, quando as cigarras, do meu céu de laranjas maduras,
rechinavam ao meu ouvido: Verão... Verão...

Missa do Galo nunca me sentou. Primeiro porque nunca vi o galo na Igreja,
depois era aquela vontade enorme de dormir, principalmente naquela noite,
para acordar no outro dia cedinho, com aquela bola de couro,
que me encantara por seis meses de espera na vitine.

Numa certa noite envelheci. Acordei com meu Pai entrando em meu quarto, pé entre pé,
mais sério que frade de filme, e pela fresta minguinha do olho,
vi quando deixou sob minha cama alguns pacotes.

No outro dia, meu Pai, minha Mãe e minhas Tias mentindo. Que lindos presentes
Papai Noel te trouxe. Aos oito ou nove anos recebia minha primeira lição de cinismo.
Porque meu Pai não me dissera que os havia comprado com seu dinheiro,
que mal e mal dava para pagar o armazém da esquina?

Então, compreendi que Natal consiste nesta mentira, de fazer as crianças entenderem,
que os presentes caem do céu, como as laranjas maduras, os passarinhos mortos.
Mas já era muito tarde.

sábado, 4 de dezembro de 2010

Boletim 61

ABRINDO A PORTEIRA.
Fazenda da quinta 8ª - O grande salto 4.
Tenho boa lembrança de quando, por volta de 1950, já estudando em Porto Alegre vinha nas férias para a Sant`Anna, e apreciava o Padrinho, assim chamava meu tio Francisco Luiz, calçando seus tamancos, e diariamente num belo carro "rabo de peixe", que só lembro ser da marca Ford, dirigir-se ao Guaraxaim na administração das grandes empresas, Arrozeira Camaquense e Luiz @ Azambuja. Já contava com o auxílio do "guarda livros" Albino Júlio Gollo, vindo de Caxias, e também morador do Guaraxaim. Vocês mais jovens, não poderão mesmo acreditar - não havia inflação! A não inflação real, não esta de hoje, escondida atrás de números "oficiais". Era um mar de tranquilidade, onde as famílias moravam nas fazendas. Foi então que aconteceu, assim como em todas as fazendas - as crianças necessitaram de escolas. Afirmo sempre, que meu único título adquirido, o de datilógrafo, e a formação de professora de minha irmã, custaram 1.000 hectares de campo ao meu Papai. Lá da Quinta a Glades foi a primeira, depois o Cesinha e o Marco Antônio. Tio Sylvio e o Padrinho compraram casas na cidade, montaram escritório no centro de Camaquã, passaram a viver comunidade. Tio Sylvio na política, foi prefeito por duas gestões, e o Padrinho na comunidade fundou o Rotary Club de Camaquã, o Sindicato Rural, o Camaquã Tênis Clube. E o campo? Bem não vão me dizer que o velho ditado: "O olho do dono é que engorda o boi" acabou...

GALPÃO.
A Querência dos Poetas Livres Vilmo Medeiros.
No último dia 15 de novembro, o Galpão do Galo Velho recebeu esta Querência, que é sui gêneris em nossa tradição campeira. Primeiro porque não temos tesoureiro, eliminando assim a droga do dinheiro, que sempre atrapalha o passo do gaúcho. Depois nosso princípio é AMIZADE, elemento de união e fraternidade. Três parceiros custeiam a "bóia" que é prato campeiro. Depois da refeição é lida a ata, elemento indispensável em qualquer entidade, para preservar sua história, e logo após, vem a Tertúlia Galponeira, o ponto alto do encontro, quando a palavra roda pela esquerda. Temos verdadeiros artistas, e quem não é artista é poeta, porque tão poeta como o que faz a poesia, é aquele que gosta de ouvir a poesia.

HISTÓRIAS QUE ME CONTARAM.
Ainda o Adriano Scherer. Esta eu presenciei.
Foi na década de quarenta, quando ainda não haviam pontes nos arroios do município. O pior cruzo era o do Jacaré, por sua forte correnteza e grande volume d`água. Então Adriano não se conformava em depender do demorado transporte dos barcos. Ele já possuía um Ford "club-coupê" (confesso que nem sei mais como se escreve) e então construiu sobre o arroio duas calhas. Cravadas as estacas, sobre elas pregou tábuas de 30, e nas laterais protegeu com guias de 15, fazendo com que as calhas ficassem no alinhamento das rodas de seu carro. Meu amigo Negro Velho, que nasceu Wilson Scherer Dias, sobrinho de Adriano, filho de sua irmã Mocinha, conta que muitas vezes pescando no Jacaré, assistiu Adriano passar com seu Ford "a mil", sem descer do carro para "alinhar". Tenho buscado fotografias destas calhas, para adicionar ao acervo do Núcleo de Pesquisas Históricas de Camaquã, mas não tenho conseguido.

FECHANDO A PORTEIRA.
Ainda o Natal.
O Espírito do Natal não morre, assim como nosso próprio espírito, que será eterno. Ele representa Deus, que nos fez a sua semelhança, e habita em nós. Representa o nascimento do Menino Jesus, que cultuamos há mais de dois mil anos. Já escrevi em algum lugar, que Natal deveria ser expressão de alegria, pelo nascimento de Cristo, mas para mim é tristeza. Por que nos aproximamos dos necessitados, ofertando neste dia nossa benemerência? Ela não deveria ser ofertada todos os dias? Mais ainda, porque aquele nascimento numa manjedoura é o símbolo da pobreza, e nos dias de hoje nos afastamos deste simbolismo, buscando e nos matando pela riqueza. Um bom Natal a todos, na simplicidade de Jesus Cristo.

segunda-feira, 29 de novembro de 2010

Boletim 60

ABRINDO A PORTEIRA.
Fazenda da Quinta 7ª - O grande salto 3.
No dia 10 de julho de 1948, sob a liderança de Francisco Luiz Pereira da Silva, a firma Luiz & Azambuja, e mais uma plêiade de homens de negócios, criou a firma Arrozeira Camaquense S.A., com sede na então Vila do Guaraxaim, hoje Santa Rita do Sul. Esta firma veio a assumir o passivo de Adriano Scherer junto ao Banco do Brasil, depois deste banco tentar por três ou quatro anos administrar aquela lavoura, na direção do Dr. Pasquier. Um dos fatores relatados por meu Papai e tios, é que Adriano, residindo no Rio de Janeiro, alertava o Dr. Pasquier para fechar a Barrinha, canal que liga a Lagoa do Guaraxaim à Lagoa dos Patos, evitando o perigo da água salgada. Este conselho não foi seguido, e o banco viu uma safra inteira perdida pela salinização da Lagoa do Guaraxaim, fato que fez o banco a se retirar do negócio de plantio de arroz. Assim a firma Luiz & Azambuja constituiu 37 parceiros agrícolas para o plantio do arroz, sendo ela própria um dos plantadores, sob a gerência do Senhor Pedrinho Castro, cunhado de Sylvio e Francisco Luiz. Assistimos então o período áureo daquela região, quando o mundo num pós-guerra necessitava repor seus estoques de arroz.


GALPÃO.
A cachaça.
Não há como negar que esta bebida sempre "habitou" nos galpões gaúchos. Num clima frio como o nosso, não podemos proibir, que o campeiro esquente o corpo num trago de canha, ao chegar do campo por vezes todo molhado e "encarangado". Assim o Galpão do Galo Velho ainda mantém um pequeno barril de 5 litros, do puro carvalho, com cachaça, e o seu conteúdo só é proibido no horário de serviço. Está escrito lá no livro do galpão: "Cachaça é o líquido alegre da vida, ou da morte, se não souber ser bebido".
Assim Jayme Caetano Braun descreve em sua poesia "Canha". Apenas dois versos:


Remédio de uso caseiro, sempre a jeito noite e dia.
Milagrosa anestesia, de muito guasca doutor.
Foste disfarce pra dor, de tanto caudilho macho,
e mamadeira de guacho, nas orfandades do amor.


Mas porém já não me iludo, com teu líquido sereno,
porque na essência és veneno, maldito licor gaudério,
destruidor sem critério, que na armada do gargalo,
vai enchendo pealo a pealo, os bretes do cemitério.


HISTÓRIAS QUE ME CONTARAM.
Ainda o Senhor Adriano Scherer.
Ouvi esta história de meu próprio Papai. Adriano residindo no Rio de Janeiro, e lá tentando o plantio de arroz na Baixada Fluminense, hoje parte do Grande Rio, foi procurado por um importante escritório de advocacia aqui do Rio Grande do Sul, levando uma proposta para entrarem com uma ação reivindicatória de perdas e danos contra o Banco do Brasil. Entre muitas alegações, uma era não terem considerado os prejuízos causados pela II Grande Guerra Mundial. Entabularam as negociações, que durou certo tempo, quando num certo dia Adriano fez a seguinte pergunta aos advogados: "O que ocorrerá com aqueles que hoje estão plantando nas terras da Luiz & Azambuja?". A resposta: "Tudo ficará paralisado, até a decisão judicial!". Adriano se posicionou contra a ação, dizendo que nada faria para prejudicar aqueles amigos, proprietários das terras, que sempre lhe acolheram com honradez.
Concluo: "Atitude de um outro tempo, pois hoje o dinheiro, tem mais valor do que as virtudes".


FECHANDO A PORTEIRA.
O Natal gaúcho.
O Natal se aproxima, e quero me reportar ao gaúcho, nascido e criado no interior de nossos campos, distante do conforto das cidades, carregando a riqueza da agropecuária riograndense. Além da singeleza de sua vida campeira, desfruta das geadas finas das madrugadas cinzentas, que enfeita o pampa sulino. Desconhece a neve, e nunca olhou um trenó. Então ao mirar um Papai Noel suando em bicas, num dezembro escaldante, assustando a piazada campeira, ele só pode arrepiar o pêlo, perguntando de onde veio aquele velho vermelho.
Cultura "nórdica", que aqui chegou para alimentar a insatisfação dos comerciantes, que não fazem parte de nossa cultura gaúcha.
O que nosso homem do campo cultiva é a tradição do "Terno de Reis", que nossos ancestrais portugueses trouxeram para o Brasil. Assim na homenagem simples àqueles que amam e cultivam nossas raízes, deixamos apenas um verso, dos mais de duzentos, que compõem o Terno de Reis.

"Vimos lhe cantar os Reis. Ó de casa, casa santa.
E também lhe visitar. Ó de casa, casa santa.
Aonde Deus veio habitar. Onde mora o bom Jesus.
Onde Deus fez sua morada, com a hóstia consagrada".

quarta-feira, 17 de novembro de 2010

Boletim 59

ABRINDO A PORTEIRA.
Fazenda da Quinta - 6ª - O grande salto 2.
Então é necessário botar nossas imaginações a funcionar. Centenas de empregados foram contratados, numa época que não haviam leis sociais, contratos de trabalho, carteira profissional, insalubridade, e tudo mais que "complica" os dias de hoje no campo, pois as leis da cidade não foram adaptadas à ele. Imaginem a quantidade de "paseiros" cavando milhares e milhares de metros cúbicos. Depois era o plantio de 2.000 hectares de lavoura de arroz, e principalmente sua colheita, feita toda ela à foice, na força do braço humano. Adriano construiu "elementarmente" a primeira ceifadeira de arroz, e com o auxílio do Núcleo de Pesquisas Históricas de Camaquã, estou publicando sua foto abaixo, assim como os tratores à querosene, que com sua falta pela 2ª Grande Mundial, ele adaptou os "gazogênios", que pela combustão da lenha nos mesmos, acionava seus motores. Imaginem a mão de obra para construir, depósitos, casas, secadores, calhas e trapiches, numa época que não haviam máquinas como hoje, e o transporte do material era todo pela Lagoa dos Patos, pois também não haviam estradas.
Obs. = Para visualizar as fotos aumentem o zoom para 150.










Os tratores trabalhando com "gazogênio", e na outra, o Senhor Adriano, na sua "automotriz"

GAPÃO.
A igualdade e a cuia.
No Galpão do Galo Velho não existe patrão nem empregado, nem branco nem preto, nem pobre nem rico. Ali somos todos iguais, sem distinção, sem preconceitos sociais. Assim se comunga na mesma cuia de mate, "misturando salivas" como diz Apparício da Silva Rillo em uma de suas belas poesias - "Cuia".

Cuia morena queimada, confeccionada "a lo bruto",
rude cálice matuto das amarguentas comunhões.
Na tradição campechana, serves o vinho que irmana,
o dono da estância e os peões.

Velho utensílio crioulo, da utilidade nativa,
que misturando salivas, no ritual dos chimarrões,
estarreces gente estranha, que não sabe a campanha,
desconhece convenções.

E quando recebes em teu bojo, a erva pro chimarrão,
e da tua carnação, verde o sangue se desata,
me entristeço imaginando, que és um coração sangrando,
por uma artéria de prata.

HISTÓRIAS QUE ME CONTARAM.
"Esta eu conto para vocês".
Lembram que contei haver no arvoredo da Quinta, alguns pés de café e algodão. Não assisti suas colheitas, eles já eram improdutivos, mas ajudei a torrar café nos tachos de cobre, que depois eram "pilados", até ficarem "moidos". A banha era produzida nas fazendas, única gordura com que se cozinhava, além da "graxa dos tutanos", com que se fazia o feijão, o qual nunca podia ser requentado. O pão, as bolachas, as broas, e tudo o mais era produzido nas fazendas, para não falar na quantidade de gente para ser alimentada. Então, as fazendeiras levantavam de madrugada, e quando deitavam também não descansavam. Um mundo que vivi. Hoje vivo num outro mundo onde não tem mais fazendeiras. Lá elas ficam depressivas, com o nada por fazer. Tudo está pronto, e o que não está pronto, as máquinas aprontam. Mesmo, não tem mais gente nas fazendas, e se tem, eles que façam as suas comidas.

FECHANDO A PORTEIRA.
A riqueza e a felicidade.
Recebi e-mail de uma amiga, onde Max Gehringer se refere à livros e artigos, com receitas para se ficar rico, que contesta, inteligentemente. Relata que se não tivesse comido suas muitas pizzas, bebidos os milhares de cafezinhos, feito suas múltiplas viagens, comprado seus vários supérfluos, teria 500 mil reais em sua conta bancária, conluindo, que aquele dinheiro só serviria para fazer tudo o que fez, promovendo a sua felicidade. Não quero contestá-lo, quero adicionar minha vivência. Conheço centenas de amigos, que são imensamente felizes, e sequer conhecem Porto Alegre, nunca comeram pizzas, nem tomaram cafezinhos em balcões, ou compraram supérfluos. Felicidade consiste em amar a si próprio. Traduzo: "si próprio" é Deus.

quinta-feira, 4 de novembro de 2010

Boletim 58

ABRINDO A PORTEIRA.
Fazenda da Quinta - 5ª - O grande salto 1.
Nada melhor que um dia depois do outro. Os opostos da vida, são como as ondas do mar. Assim no ano de 1933, o Senhor Adriano Scherer assumia como parceiro agrícola, instalando-se em uma erma coxilha, junto a Lagoa do Guaraxaim, onde hoje está situada a Vila Santa Rita do Sul, antigamente chamada de Guaraxaim, 2º Distrito do Município de Arambaré. Nasci em 1934, mas tenho presente os "lances épicos" deste desbravador. Construiu uma vila de casas para empregados, uma bela morada para si próprio, que ainda hoje existe, secadores e depósitos para o cereal, trapiche, onde aportavam as "gazolinas", que transportavam o arroz para Pelotas e Porto Alegre, instalou um locomóvel à vapor, movimentando as bombas para o recalque d`água, e fornecendo luz elétrica para a vila. Muito mais que isto foi o que fez nas terras arrendadas. Tudo era banhado de "tiriricas" e "macegas estraladeiras", que ele drenou, e construiu mais de dez quilômetros de canais de irrigação, além dos aterros (estradas) para escoar a produção. Tudo feito "à pá", na força do braço humano. Para se ter idéia, o dreno que chamamos ainda hoje de "Quatorze", tem o nome porque possui "quatorze braças de boca", cada braça tem 2,20 m portanto eram mais de trinta metros de largura, cavados com três turmas de cada lado do valo, onde uma atirava a terra para a outra, até a superfície. Quando o Banco do Brasil assumiu a lavoura com a quebra de Adriano, ficou a direção com o agrônomo Dr. Pasquier, que pela primeira vez fez uso dos teodolitos, quando os técnicos não acreditaram que Adriano houvesse marcado aquele valo, no "olho", acertando além do seu traçado, na largura necessária para drenar a grande várzea.


GALPÃO.
Meu santuário de fumaça.
Passado o Dia dos Mortos, quando reverenciei suas memórias "agachado" no Galpão do Galo Velho, contemplando o dançar das labaredas do fogo, e sismando com o tempo grande que passou, reporto-me novamente à Balbino Marques da Rocha, que foi o mestre do imortal Jayme Caetano Braum, com seu verso "Galpão do Rio Grande". Fica apenas o primeiro verso.


Meu santuário de fumaça, onde as vezes desencilho.
Faço um altar de lombilho, do fogo a reminiscência,
e cultuo a dor da ausência, no oratório do passado.
Galpão onde eu fui fedelho, corpeando cabo de relho,
tirando rapa de tacho, onde os avós se reuniram,
e a cavalo partiram para uma cruzado de macho.
Aqui me curvo e me agacho, me inclino e as vezes me ajoelho.
Desato o breve à oração, revendo de um lado e de outro,
quando o Rio Grande era potro, e os que domaram meu chão.


HISTÓRIAS QUE ME CONTARAM.
O grande locomóvel Wolf.
Podemos afirmar que este foi o maior lance de Adriano Scherer. Como a primeira necessidade de uma lavoura de arroz é a água, ele logo tratou de comprar a moderna máquina à vapor, que chamavam de locomóvel estacionável, fabricado na Alemanha. Esta máquina se encontrava na Divisa, aqui no município de Camaquã, e o seu transporte foi uma verdadeira odisséia. Não posso precisar quanto tempo ele levou, no grande percurso de arrasto. Eram dois tratores, pasmem, de esteiras, e quarenta juntas de bois. Dizem que ainda hoje existem os "buracos" onde esta máquina ficou atolada por dias. A região não era drenada, e tudo era banhado. Estes fatos me foram contados por meu Pai, que certa feita foi chamado em alta madrugada, para auxiliar numa das atoladas. Constatou que estavam faltando boieiros. Pediu que Adriano providenciasse quarenta homens com aguilhadas, quando então subiu na máquina, dizendo que ao seu grito todos teriam que aguilhoar sua junta de bois ao mesmo tempo, enquanto os tratores já estivessem na tração. Assim conseguiu realizar a "desatolada".


FECHANDO A PORTEIRA.
Minha grande riqueza.
Noutro dia "arranhando idéias" com minha Jane, ela se exasperava com a falta de dinheiro, e as contas acumuladas, quando concluiu - "Estamos pobres!". Então num sopetão retruquei: "Minha riqueza só Deus tira. Os homens não me roubam mais, pois ela é a minha saúde, da minha família e de meus amigos". Agora, depois de meditar muito sobre o acontecido, posso afirmar, que é muito mais agradável administrar o pouco que possuo, do que o muito que já tive. Não estou pedindo que vocês desprezem o muito que tenham, mas que tenham cuidado, pois ele não é o principal em vossas vidas.

sábado, 30 de outubro de 2010

Boletim 57

ABRINDO A PORTEIRA.
Fazenda da Quinta - 4ª - A grande crise.
Deveria incluir este capítulo em Histórias Que Me Contaram, porque me foi contado por meu pai Mário. Quando da grande crise de 1930, com a quebra do Banco Pelotense, a economia mundial, mais especificamente a gaúcha, ficou de pernas para o alto, ou de cabeça para baixo, como queiram. A Fazenda da Quinta, como tantas outras, parou suas atividades, e meu Pai me contava, que passaram dois ou três invernos jogando solo, pois não tinham sequer como chegar na vila do Duro. Ele, meu Pai, ainda morava lá, já casado com a herdeira Thereza, e com minha irmã Maria de Lourdes nascida. Minha avó Anna América falecera naquele mesmo ano. Era um verdadeiro caos, econômico e familiar, pois a fazenda deveria ser dividida entre os quatro filhos: Thereza(Mário), Maria(Lauro), Sylvio e Francisco Luiz. Este último sempre considerado o cérebro da família, jogou tudo na emergente lavoura de arroz, considerando a boa água da Lagoa do Guaraxaim, capaz de fechamento da sua barra, evitando assim a água salgada da Lagoa dos Patos, como também, na boa qualidade de suas terras. Assim convenceu o outro irmão e o cunhado Lauro, a procurarem um parceiro agrícola, que encontraram na pessoa do Senhor Adriano Scherer. Meu Pai, entretanto, não quis participar da firma Luiz & Azambuja, separando suas terras, e formando a Fazenda Sant`Anna.

GALPÃO.
Uma homenagem ao Galo Velho.
Em 2 de julho de 2005, três dias antes das Bodas de Pratas do Galpão, meu Parceiro e amigo Júlio Macedo Machado dedicou àquele negro velho, esquecido e pelegueando lá na Invernada do Esquecimento, os dois versos abaixo.

Lembrança do Galo Velho,
na Fazenda da Sant`Anna,
alma pura e soberana.
Peão campeiro e de coragem,
deixou seus gritos na imagem,
e na lembrança do Patrão.
Galo Velho este galpão,
foi feito em tua homenagem.

Este galpão tem história.
Eu trago dentro do peito,
onde a Paz e o Respeto,
é o lema do bom Patrão.
Lareira, fogo de chao,
não apaga noite e dia,
com a sua caloria,
aquece qualquer peão.

HISTÓRIAS QUE ME CONTARAM.
O fogo de chão do galpão da Quinta.
Em uma conversa com meu primo e amigo Cesar Augusto Luiz Pereira da Silva, que nasceu e se criou na Fazenda da Quinta, filho de Francisco Luiz Pereira da Silva e de Ivone Pereira, contou-me que o fogo de chão, do galpão da fazenda, não apagava nunca. Tinha certa lembrança disto, mas não podia afirmar. Era uma tradição nas fazendas antigas, e meus tios Sylvio e Luiz mantiveram esta tradição, enquanto a administraram. Já relatei anteriormente, que os campeiros eram muitos, os invernos tiranos, e o galpão sempre com o fogo aceso aquentava os corpos, matava a sede nos fartos chimarrões, descansava os corpos nos estirados pelegos, alegrava nos tragos de canha e, alimentava com o bom churrasco, pois a carne era farta "às pampas".

FECHANDO A PORTEIRA.
Quando você não consegue.
Quando você não consegue o objetivo final, o que resta? Apenas duas coisas - se conformar, ou se revoltar. Parece, mas não é uma questão de opção, pois se analisarmos profundamente será uma questão de caráter. Quantas perdemos? Quantas ganhamos? E tudo continua igual, pois tudo passa. Vejam que não estou falando em nada material, pois matéria não é nada, é pó. Estou falando de sentimento. Amores perdidos, amizades arranhadas, lares desfeitos. Tudo passa, e tudo se refaz, quando se tem amor a Deus, fé nas suas mensagens, esperança e caridade, que na sua essência é amor aos nossos semelhantes. Li em Fernando Lucchesi: "Só quem se preocupa em fazer a felicidade dos outros, alcança sua própria felicidade". Meditem, e sejam felizes.

quarta-feira, 27 de outubro de 2010

Boletim 56

ABRINDO A PORTEIRA.
Fazenda da Quinta - 3ª - A família.
Meu avô materno, Adolfo Luiz Pereira da Silva, um de seus proprietários, faleceu com pouco mais de tinta anos de idade, na década de vinte, do século passado, deixando os filhos: Thereza, Sylvio, Maria e Luiz, ainda crianças. Meu pai, Mário, que era seu sobrinho e depois seu genro, costumava me contar que ele era um homem grande e forte, e certa feita retornando do campo todo molhado pela chuva, a sua esposa, Anna América, lhe esperava com um chá quente mostrando preocupação, quando ele disse ser muito forte, dando dois socos "nos peitos", passando a tossir logo em seguida. Trinta dias após estava morto, por uma "tuberculose galopante".
Meu avô paterno, Ney Xavier Azambuja, casado com a irmã de Adolfo, Faustina Pereira da Silva, assumiu a administração da grande fazenda, trazendo como capataz o filho mais velho, Mário, e como agricultor, na incipiente lavoura de arroz, o outro filho, Lauro, terminando o primeiro por casar com a prima Thereza, e o último com a outra prima Maria.
Anna América veio a falecer em 1930, quando então a fazenda foi dividida. Entretanto, Sylvio e Luiz, fizeram sociedade com o primo e cunhado Lauro, constituindo uma importante firma, Luiz & Azambuja, responsável pelo desenvolvimento da Vila Santa Rita do Sul, ao trazerem como parceiro agrícola o Senhor Adriano Scherer.


GALPÃO.

Meus olhos ainda alcançaram, quando naquela Fazenda da Quinta, em uma mangueira de pau à pique, os cavalares ao serem encerrados na madrugada, ao grito de "forma, forma" ficavam com suas ancas encostadas na paliçada, e as cabeças voltadas para o centro da mangueira. A explicação é muito simples, pois devido ao escuro da quase noite, seria difícil identificar os animais por seus campeiros, o que só seria possível por suas cabeças. Todos sabemos que cada cabeça é uma cabeça, não é mesmo? Antevejam que eram muitos campeiros, e lógico, muitos cavalos, já que eles eram a riqueza das fazendas, pelos constantes combates guerreiros.

HISTÓRIAS QUE ME CONTARAM.

O prazer.

Ouvi esta história do próprio Galo Velho, quando lhe questionei como era o salário naquele "outro tempo".

"Menino. A gente trabalhava por prazer. Tínhamos orgulho de encilhar bem nossos bons cavalos, trazendo os aperos cuidados, principalmente nossos laços. O serviço era campo à fora, pois não tínhamos as mangueiras de hoje. Imagina tratar aqueles animais quase selvagens, quando era preciso dois laçadores ao derrubá-los, para serem curados. Pouco se castrava, já que quase tudo era ao natural, e os touros mais fortes predominavam nos rodeios. O cuidado maior era com as grandes manadas de cavalares, a riqueza do campo, juntamente com os couros. Então se cuidava das domas, das castrações dos mais fracos, pois os próprios reprodutores evitavam a consanguinidade de suas manadas. Os trabalhadores eram tratados como da própria família, e nada faltava para seu bem estar. A comida era a mesma do patrão, as roupa eram boas, mesmo sendo usadas, boa coberta e atendimento de saúde pelo próprio médico da família. Dinheiro não tinha utilidade, pois nada havia para se comprar. Foi realmente um outro mundo".

FECHANDO A PORTEIRA.
Ainda o prazer.

Esta conversa com o Galo Velho, contando que se trabalhava por prazer, faz lembrar outras atividades que também não eram remuneradas, e muito melhor desempenhadas que as de hoje em dia. Meu Pai foi vereador em Camaquã por três ou quatro administrações, e nada recebia em troca de seus serviços, que desempenhava por amor ao seu partido político, o PL, Partido Libertador. Os jogadores de futebol também nada recebiam, e seus esforços eram por amor aos seus clubes. Fico me perguntando se o dinheiro "engoliu" os ideais.

sexta-feira, 15 de outubro de 2010

Boletim 55

ABRINDO A PORTEIRA
A Fazenda da Quinta - 2ª - A sede.
Ela foi construída na segunda metade do Século XIX, por meus tetravôs, João Luiz Pereira da Silva e Faustina Maria Centeno, caracterizando-se pelo estilo colonial português, coberto com telhas portuguesas, com a frente para o poente, tendo na fachada uma só porta de entrada, e sete janelas. As paredes são largas, construídas com tijolos em formato duplo, ou seja, quadrados, com 50cm x 50cm. Quando de uma das reformas, colocaram na sua frente, esquina sul, um marco de sesmaria "fincado" na própria calçada, que na fotografia é visível à direita da foto. Estes marcos serviam para as demarcações das propriedades, quando não haviam inventado o aramado, e pesa cerca de uma tonelada, possuindo quatro metros de comprimento, e 50 cm de diâmetro, sendo que na cabeça está entalhado um anel, na própria pedra. No mesmo alinhamento da casa, distante vinte metros, foi construído um grande galpão, constando de dois quartos, sala e banheiro, destinados aos visitantes não familiares, possuindo ainda ampla garagem, que era abrigo das carruagens, e mais três quartos para empregados, com salão, fogo de chão e cozinha. Atrás de tudo isto ficava o lindo arvoredo, com cerca de dois hectares. É necessário dizer que hoje tudo está em ruínas, fazendo lembrar os velhos castelos europeus, onde os proprietários não tinham como mantê-los. Glades Pereira da Silva vendeu a Fazenda da Quinta para a tradicional família camaquense, Bezerra Netto, que nela não reside, e mantém habitável apenas uma casa confortável, construída nos fundos, pela própria Gladis, que foi a primeira a abandonar a grande sede.




GALPÃO.
Uma noite de inverno.
Foi neste galpão da Quinta, que ocorreu um fato marcante em minha vida. Cinco horas da madrugada lá chegava, para pedir uma caçada de marrecão. Dirigia a fazenda minha prima Glades Terezinha, filha do Cel. Sylvio Luiz Pereira da Silva, e que certamente àquela hora estava dormindo. Não era meu propósito acordá-la, queria apenas avisar que iria caçar, então, com o minuano "assobiando", e tiritando de frio, não tendo encontrado alguém acordado, procurei pelo fogo de chão do tradicional galpão, onde para minha surpresa, além de não ter fogo, nem mesmo tinha lenha para "prender um lume". Rezei pelos meus ancestrais, prometendo a eles que no Galpão do Galo Velho, desmembrado daquele galpão ali, jamais iria faltar lenha, e que o fogo também nunca apagaria. Estou cumprindo com minha oração.

HISTÓRIAS QUE ME CONTARAM.
A lenda do chimarrão.
Já escrevei, tudo que é velho tem suas baldas, e quanto mais velho então, como é o caso do nosso chimarrão, passa a ter lendas.
"Cansado com as andanças da tribo, um velho índio reusou-se a seguir com ela. A mais jovem de suas filhas, chamada Jary, decidiu permanecer junto dele, vendo seu amor , Pery, perder-se na curva do mato, com o restante da tribo. Certo dia entrou na taba um estranho pagé, que sabendo do gesto da jovem índia, tentava uma recompensa por sua atitude fraterna. Perguntou a ela o que queria para ser feliz, mas ela permaneceu em silêncio nada pedindo. O velho índio respondeu em seu lugar: "quero renovar minhas forças, para retornar à minha tribo, levando minha Jary, para junto de seu noivo Pery". O pagé entregou então ao velho, uma planta de cor muito verde, chamada "caá-y", ensinando aos dois como plantá-la, colher suas folhas, secá-las ao vento, para depois triturar, fazendo com ela uma infusão reconfortante. Em pouco tempo o velho índio renovou suas forças, retornando à tribo.
A bela índia Jary ao passar de duas luas, reencontrou a tribo, e nela seu grande amor, que persiste ainda hoje, nos constantes beijos que ofertamos em nossas bombas do chimarrão.

FECHANDO A PORTEIRA.
O ócio!
No último fim de semana, mais precisamente sábado passado à noite, me encontrava no galpão sismando com os negros velhos da beira do fogo, quando ali entrou cheia de alegria a Eunice Machado, que pescava com meus netos no açude. Plena de vida disse que iria fazer um espinhaço de ovelha com pirão, para a turma "das casas". Ora, seriam mais de dez pessoas, e fiquei pensando exatamente o quanto de trabalho ela teria pela frente, e sozinha na lida. Mais que tudo admirei o amor que habita em seu coração. Lembrei de uma dos ensinamentos da minha Ordem Maçônica - "O ócio é um dos vícios que destrói a alma humana". Incontestável. Acrescento mais: a mente estará tão descansada, quanto mais cansado estiver o corpo.

quarta-feira, 6 de outubro de 2010

Boletim 54

ABRINDO A PORTEIRA.
Fazenda da Quinta - 1ª - Origem.
A Fazenda da Quinta foi desmembrada da Sesmaria Flor da Praia, quando Faustina Maria Centeno, filha do Sargento-Mor Boaventura José Centeno e de Dona Antônia Joaquina Gonçalves da Silva, irmã do Gal. Bento Gonçalves, recebeu como herança, mais de dez mil hectares de campo. Faustina veio a casar com o português João Luiz Pereira da Silva, um experto na arte da enxertia, que construiu um pomar tão grande e perfeito, que deu nome à Fazenda da Quinta. Transmito uma idéia do que foi este pomar. Sob a ramada do parreiral, percorria-se um longo caminho, até chegar à taipa do açude, onde havia um excelente local de banho, e pescaria. Dos dois lados deste parreiral, desenvolviam-se as mais diversas espécies de árvore frutíferas da região, onde também conheci alguns pés de café e algodão. O velho tear também é de minha lembrança, onde se confeccionava o tecido para as peças de roupa, já que na época não havia ovelha na região, e o café ali não chegava. Não é preciso dizer que ambos eram de péssima qualidade, e pouca produtividade, devido às geadas. Conheci também um imenso pé de pinheiro, que chamavam de pinheiro imperial, mas não sei dar sua origem. As palmeiras imperiais eram abundantes, e ainda hoje existem na região, alguns de seus "filhos", que vieram procedentes do Jardim Botânico do Rio de Janeiro. Do casamento de João Luiz com Faustina conhecemos dois filhos - Boaventura Luiz Pereira da Silva, que com Izabel Eufrásia, neta do Gal. Bento Gonçalves (aquela gente viajava muito pouco) , teve um filho chamado de Cel. Boaventura Luiz, chefe do Estado Maior do Gal. Zeca Netto, e pai de Dona Izabel Silveira da Silva, casada com o saudoso amigo Dorval Ribeiro. O outro filho, foi Francisco Luiz Pereira da Silva, conhecido por Vô Chico, casado com Tereza(?) com quem constituiu dois filhos: Adolfo Luiz Pereira da Silva, casou com Anna América Centeno, que com ela teve quatro filhos: Thereza, casada com o primo Mário; Maria, com outro primo Lauro; Sylvio, com Morena e, Francisco Luiz, conhecido como Luizinho, com Ivone. A outra filha do Vô Chico foi Faustina, que casou com o Cel. Ney Xavier Azambuja, proprietário da Fazenda da Invernada, e tiveram treze filhos, mas sobreviveram apenas oito: Mário, que casou com a prima Thereza; Mariá, com Tito Paranhos Barcellos; Lauro, com Maria; Marieta, com José Olavo Fay; Ney, com Nilda Souza; Marcolina com Romeu Luiz Pereira da Silva; Cel. Dário, com Maria de Lourdes Vilamil e, finalmente Adolfo, que casou com Zilda Souza.
No próximo tentarei dar a descendência deles.

GALPÃO.
Sou originário dos dois galpões - Fazenda da Quinta e Fazenda da Invernada - que não tiveram suas histórias gravadas. Creio que poucas fazendas o tem. Assim vou me esforçando para que o passado não se acabe. Não esqueçam, o hoje, logo será um passado também.

HÍSTÓRIAS QUE ME CONTARAM.
A hospitalidade gaúcha.
Um dia de verão, em plena canícula do pós meio dia, quando até as aves calam seus cantos, e o gado busca o abrigo de uma sombra, o Cel. Ney Azambuja também buscava a sombra da frondosa figueira da Quinta. Estendendo a vista pela grande várzea, avistou o carroção toldado, tracionado por duas juntas de lerdos bois.
- Imagina, disse o sisudo Cel., aquele pobre boieiro com todo este calor, sem buscar um abrigo para descansar. Vai lá Galo Velho, pelegueia o petiço, e manda aquele pobre cristão se chegar "pras casas". Avisa Sia Mosa que tem mais um peão para o almoço.
Cumprida a ordem, o carroção retornou pelo trilho da estrada, mas ao parar junto da cancela da fazenda, desceu de dentro dele mais de dez homens. Era uma "turma de granja" para a moderna lavoura de arroz dos Irmãos Centeno, lá da Pacheca. Ao caudilho Cel. não restou outro recurso senão sorrir, e saudando o pessoal, pediu que passassem ao galpão, onde seria servido o almoço.
- Galo Velho, volta na cozinha e diz pra botarem mais água no feijão, e leva um trago de canha e uns mates, pra acabar logo com a sede desta gente.

FECHANDO A PORTEIRA.
Ainda a carreta de bois.
Reportando-me àquela carreta de bois, com a turma de granja, fiquei sismando na cena, que o modernismo apagou do cenário gaúcho. Apparício Silva Rillo retrata muito bem a carreta, num de seus mais lindos versos. Para não alongar, registro apenas dois.

Foste a patrulha avançada,
do batalhão do progresso,
e na incerteza do regresso,
ao passo lerdo dos bois,
apontavas novas rotas,
e nos rastro das cambotas,
brotavam vilas depois.

Velha carreta esquecida,
desengonçada e capenga.
Foste a maior andarenga,
que o Rio Grande conheceu.
quase a ninguém hoje importas.
No museu das coisas mortas,
o Progresso te esqueceu.

terça-feira, 28 de setembro de 2010

Boletim 53

ABRINDO A PORTEIRA.
Fazenda da Invernada - 5ª - "A periferia".
Para concluir a história da Invernada, que na verdade não teria fim, finalizo descrevendo sua periferia. Um verdadeiro banhadal, transitável só por carroças e principalmente por cavaleiros, que eram os grandes "andantes" da época, até chegarem na grande coxilha, onde ficava a sede da fazenda. Então a fauna e a flora estavam intocadas, e só aos olhos de quem assistiu, para ainda hoje se extasiar com aquelas distantes imagens. Bandos e mais bandos de tahãs, com seus gritos alucinantes, dia e noite. Depois todo o tipo de animal, que hoje estão quase extintos - veados, com suas galhadas, porcos do banhado, que eram caçados à laço pelos campeiros. Jacarés, "às pampas", assustando os banhistas do açude perto das casas. Não me lembro de cobras venenosas, pois parece que elas não gostam de terrenos úmidos. Bandos de colhereiros, com seus voos desengonçados, cor de rosas, silenciosos, mas majestosos. Maçarico Real, que hoje não se vê mais, mas costumavam pousar nas cabeças dos mourões dos aramados. Revoadas de Marrecões da Patagônia, marrecas de todos os tipos, aves abundantes, enfeitando terra e céu. Uma estrada formada por dois trilhos, alagados, no "chape-chape" do andar das cavalgaduras. Uma vida sem pressa. Um tempo lindo e comprido, que pertenceu a uma gente, que não temia pelo amanhã.

GALPÃO.
A varanda e a "parrilla"
Finalmente dia 26 passado foi inaugurada, lá no Galpão do Galo Velho, a varanda e a "parrilla", pelo meu filho Luis Mário, vulgo "Castiano". Por sugestão da Anamiss estou anexando as fotos, que ela diz, acertadamente, fazerem parte da história, e eu afirmo mais, "encurta o escrever". Além do escrevente e a sua Jane, de 52 anos de bela vida matrimonial, lá estavam o Rubem Carlos Serafini Machado com a sua "expedita" Eunice, além do Luis Mário com a sua amada esposa Majô, e o filho mais moço, o pescador e campeiro Ramiro. A filha mais velha deles, Roberta, a pianista e cantora, ficara em Camaquã, curtindo uma festa de aniversário, e já tomando conta da casa. Que coisa linda!
Grupo clicado pelo Rubem Machado




O grupo clicado pela Eunice Machado

HISTÓRIAS QUE ME CONTARAM.
A terapia do abraço.
Esta não é bem uma história, pois está aí na intenet, e me chegou às mãos pelo Irmão Eduardo Huber.
Pois é, durante muito tempo estivemos a procura de alguma coisa que nos rejuvenescesse, que prolongasse nosso bom humor, que nos protegesse contra as doenças, que curasse nossa depressão, e nos aliviasse do estresse.
E encontramos!... o remédio já havia sido descoberto e já estava a nossa disposição. E continua ao alcance de nossas mãos. E não custa nada.
É o abraço! O abraço é milagroso. É medicina realmente muito forte. O abraço, como sinal de afetividade e de carinho pode nos ajudar a viver mais tempo, proteger-nos contra doenças, curar depressões, fortificar os laços conjugais e familiares. O Abraço é um excelente tônico. Hoje sabemos que a pessoa deprimida é bem mais suscetível à doenças. O abraço diminui a depressão e revigora o sistema imunológico da pessoa.
O abraço injeta nova vida nos corpos cansados e fatigados, e a pessoa abraçada se sente muito mais jovem e vibrante. O uso regular do abraço prolonga a vida, sara a depressão e estimula a vontade de viver e crescer na vida. Não há como dá-lo, sem ganhá-lo de volta!
Recebam o Abraço do Galo Velho!


FECHANDO A PORTEIRA.
A Paciência.
Pois fiquei matutando nela. Paciência é uma qualidade de quem é bom. Digo mais, é o primeiro degrau da felicidade. O paciencioso é um ser esperançoso, pois não conheço nenhum que seja pessimista. Ele tem a propriedade da resignação, ou seja, aceita os reveses da vida, na paciência de que tudo passará. Nada melhor que um dia depois do outro. Pensem nos velhos ditados: "A pressa é inimiga da perfeição" e, "De vagar se vai ao longe". Certamente ninguém lhes dá mais os devidos valores, só os velhos como eu. Assim fico assistindo os apressados de hoje, ou impacientes de hoje, correrem adoidados, na busca de alguma coisa, que nunca perderam. Não perderam em lugar algum, e o pior, não sabem, que tudo está dentro deles mesmos, bem ali, onde mora o Criador de Todas as Coisas. Pensem mais - nas mortes dos apressados no trânsito, e nos apressados no acelerar os batimentos cardíacos. Vamos ficar calmos, pacientes, esperançosos, resignados. Parece ser muito difícil, mas não é. Afirmo, até mesmo, que é muito fácil. É só "matutar".

terça-feira, 21 de setembro de 2010

Boletim 52

ABRINDO A PORTEIRA.
Fazenda da Invernada - 4ª - "A roda do mate".
Vocês não fazem idéia de como se mateava naquele tempo. O primeiro deles era na madrugada, pois a gente deitava "com as galinhas". Sem luz, no escuro, nada o que fazer, além de filhos. Depois vinha o mate do "tira fome", às onze horas da manhã, e se o tempo estivesse ruim se mateava o dia inteiro, mas o mais disputado era o mate do "entardecer", quando a grande família se reunia na frente da casa, num pátio bem varrido, sob a ramada de uma figueira. O mate corria solto pela direita, servido pelo cevador, numa grande chaleira de ferro, com água fervendo. Fervendo mesmo, não há exagero, sou testemunha, pois "tocava" aos guris fazer a troca das chaleiras. Custei a descobrir o porquê - era para "espantar" as mulheres e os jovens da roda do mate! Machismo minha gente. Como havia machismo naquele tempo.

GALPÃO.
Ainda as conversas com o Galo Velho.
Recordo de uma conversa com o Galo Velho, quando perguntei da sua origem paraguaia.
"Meu pai era paraguaio. Eu nasci na Fazenda da Invernada, onde ele se juntou com uma querida negra de nome Maria, de quem eu nasci. Só sei contar o que ouvi dele nas rodas galponeiras, que eram histórias de tristezas. A gente sabe que se nosso tempo está difícil, o dele foi muito mais. Ele contava das muitas lutas, e do ódio tirano que reinava entre a gauchada da época, quando os homens mais se paravam no campo de batalha, do que junto de suas famílias. Então o assunto era como se morria, e como se matava. Meu pai veio como escravo para a Fazenda do Cristal, dos filhos do Gal. Bento Gonçalves, quando da tomada de Uruguaiana pelas tropas imperiais brasileiras. Sendo aprisionado ele passou a escravo do conquistador, como era hábito naquele tempo. Naquela luta ele perdeu a primeira mulher, que ali lhe acompanhara, e dizia que não tivera filhos com ela. Lembro que ele era um homem triste, mesmo tendo um patrão amigo como o Capitão Ignácio Xavier Azambuja, que o comprara dos Gonçalves. Agora parece que a vida está mais amena, as revoluções terminaram, e o ódio político chegando ao fim, permitindo que a gente atenda melhor o serviço e a família".

HISTÓRIAS QUE ME CONTARAM
O primeiro aramado de Camaquã.
Esta história me foi contada pelo Tio Dário Silva Azambuja, quando de uma visita que fez ao Galpão do Galo Velho. Procurei o registro do acontecido nos livros, mas ainda não encontrei. Sei que lá está gravado, já que os "causos" galponeiros, assim como as visitas, estão ali escritos. Bem, meu Tio Dário contou que o primeiro aramado que se tem notícias em Camaquã, foi na Fazenda da Flor da Praia, quando de propriedade do caudilho Gal. Zeca Netto. Não confundir com o Gal. José Antônio Netto, lá da Revolução Farroupilha e bageense, que era tio daquele. Estou falando do pai do Senhor Florisbelo Netto conhecido como Belinho, pai do José Cândido de Godoy Netto. Certamente mais uma bela fazenda sem história. Escrevam a história de vocês, não deixem as coisas morrerem! Mas voltemos ao tal aramado. Ele foi executado pelo cidadão Taborendengui. Receio errar até mesmo seu nome, que era de um capitalista, que "cruzou" por Camaquã, quando aqui foi sócio de Hildebrando José Centeno, numa grande charqueada, lá nas margens do Rio Camaquã, onde trabalhavam mais de quinhentos homens. Esta história também não está escrita. Contar história é uma coisa, outra coisa é escrever a história.

FECHANDO A PORTEIRA.
As intenções.
O título me faz reportar as orações, que a maioria dos cristãos, executa "nas intenções" aos seus santos favoritos. Por vezes são intenções ao Santo Antônio, o santo casamenteiro, dando vez a mil e uma intenções. Coitado do fiel. Fica rezando, na certeza que "alguém" está lhe ajudando, quando na verdade quem deve se ajudar é o próprio fiel. Não importa nossas intenções, o que importa são nossas ações. Recordo do meu tempo de jovem, quando ajoelhado junto ao Padre Walter Hanquet, confessava meus pecados: "padre pequei por pensamentos, obras e ações". Santo Deus de Misericórdia, quanto às minhas obras e ações eu sei responder por elas, mas meus pensamentos! Quanto pecado! Imperdoáveis, portanto, não mereço o céu. Pois ainda hoje, já velho, pratico "A Prova Quádrupla" do Rotary, onde está escrito: (do que pensamos, dizemos e fazemos) - 1º - É a Verdade? 2º - É Justo para todos os interessados? 3º - Criará Boa Vontade e Melhores Amizades? e, 4º Será Benéfico para todos os interessados? Bem, aí a coisa não é tão material, nos projetando ao terreno espiritual, mas aqueles meus pecados, "por pensamentos", eram materiais sim...

domingo, 12 de setembro de 2010

Boletim 51

ABRINDO A PORTIRA.
Fazenda da Invernada - 3ª - "Café da manhã".
A mesma mesa do jantar, agora no horário das 8 horas. Os homens encilharam na madrugada, levando seus "fiambres" para o almoço. O velho caudilho não encilhava mais, ou melhor, só não encilhava os cavalos. O café era farto, como se prezava em fazenda rica. Pão caseiro, broa de milho, bolo e batata doce. Bolacha égua, que ali chegava em barricas, e alguns biscoitos caseiros. O leite vinha fervendo lá da cozinha, junto com o bule de café preto. Então, eu tirava aquela nata que se forma sobre o café com leite, quando o tirano perguntou, o que eu estava fazendo. Disse que tirava a pequena nata, mas ele insistiu, perguntando se eu gostava de nata. Descobri depois de tinha uma prima "mexeriqueira", que nos entregava ao velho. Dei uma resposta evasiva, que não me importava muito com a nata. Ele calou, e o café terminou tranquilo. Ao sairmos ele me chamou. "Lavou a boca hoje de manhã?". Sim Vovô. "Então abra a boca para eu conferir". Foi o que fiz, quando entrou uma colher cheia de nata na minha boca, e nos meus ouvidos - "Coma para aprender!" Claro que não aprendi, pois 70 anos passados ainda detesto nata. Mas, aprendi obediência e respeito, coisa que os jovens de hoje desconhecem.

GALPÃO.
As carreteadas.
Já falei em outro boletim, o quanto a Fazenda da Invernada, e mais ainda a Fazenda da Quinta, ficavam distantes da Vila do Duro, por tal, eram abastecidas da Vila da Pacheca, que recebia mercadorias de Rio Grande, onde moravam meus bisavós, e também de Pelotas. Muitas vezes vi o carroção toldado, tracionado por duas juntas de bois, sair em viagem, quando além do boeiro sentado na boléia, vinha um peão a cavalo com aguilhada comprida, cavalgando ao lado. Imaginem que as fazendas mandavam, por um "próprio", os seus pedidos aos parentes de Rio Grande, já que lá residia o vovô Ignácio Xavier Azambuja. Estas cartas eram transportadas em barcos a vapor, que vinham à Pacheca buscar lenha, da mataria do Rio Camaquã, o grande "combustível" da época. Pacheca era uma vila muito mais próspera, que a própria Vila do Duro.

HISTÓRIAS QUE ME CONTARAM.
Meu amigo Claudio Roberto Ribeiro (claudioribeirors@brturbo.com.br) contou-me sua história, que nunca imaginei fosse tão campeira. Hoje um homem realizado, chefe de uma linda família, integrado na nossa sociedade, aposentado do BB, e principalmente avô do "colorado" Theo.

"O isqueiro matou o 'fósfro', e a luz matou o isqueiro. Os caminhões mataram as tropas, e a saudade matou o tropeiro!" (Autor desconhecido)

"O corredor das Tropas".
"Começa a chegar a Semana Farroupilha e, mais uma vez, sinto-me meio deslocado, menino de cidade.
Morei a poucas quadras do "Corredor das Tropas", caminho que faz a ligação entre o Bairro das Três Vendas e o Porto de Pelotas, onde estavam localizados os matadouros dos grandes frigoríficos - Swift, Anglo, Armour. Em outras palavras: o caminho entre o Hipódromo da Tablada e o Solar da Baronesa, no Areal.
Vi passarem tropas tão grandes que a gurizada sentava-se à beira da estrada para assistir.
Muita poeira, muito barulho de casco, latido de cachorro, gritaria de gente e... muito mugido triste.
O cheiro doce/podre nos locais de matança é algo que adere ao nariz e à memória.
Também trabalhei numa ferraria, ferrando cavalos, batendo malho pra fazer os aros das rodas de carroça. Pata do animal apoiada no meu joelho, muito casco aplainei (que fedor!) pra colocar as ferraduras ainda meio quentes. Lembro das ferraduras fininhas para os cavalos parelheiros...
Também ajudei o verdureiro da chácara que ficava na frente da nossa casa. Encilhei muito cavalo para a carroça/charrete do reparte.
Meu pai foi motorista de estancieiro, motorista de "barraca" de lãs. Menino, antes do primeiro emprego formal aos quatorze anos, fui muito para Bagé, Hulha Negra, Pedras Altas, Herval... Temporadas invernais em lugares que até Deus duvida que tenha criado... Muito galpão, muitos cavalos... e todo tipo de comida à base de carne de ovelha. Meu Deus, como tem ovelha no mundo!
"Desculpem, não tive tempo de ser gaúcho."

FECHANDO A PORTEIRA.

A Querência dos Poetas Livres.

Pois vou falar de um movimento campeiro. Diferente de todos os demais, sem fugir da cultura de nossas tradições. Apenas quatro reuniões anuais, em meses estabelecidos e nas terças feiras à noite, começando as 20hs e terminando as 23hs impreterivelmente. No rancho ou galpão de um parceiro, com a janta e bebida "patrocinada" por três Parceiros. Tudo na simplicidade do gaúcho, comida campeira, chimarrão, ceva ou vinho dependendo da temperatura ambiente. Não temos tesoureiro, pois dinheiro e mulher são os maiores problemas gaúchos, entretanto, as esposas dos Parceiros, também chamadas de Parceiras, participam ativamente. Não temos Regimentos, apenas 12 artigos de um Regulamento, sem outra obrigatoriedade que a moral e o respeito. Nem mesmo somos obrigados da frequência, vai quem gosta e quer.

sábado, 28 de agosto de 2010

Boletim 50

ABRINDO A PORTEIRA
Fazenda da Invernada - 2ª - "Sala de jantar".
Uma grande mesa oval, numa sala retangular, com três janelas para um pátio interno, e iluminada com três lampiões aladim. Na cabeceira o vovô caudilho Ney Xavier Azambuja, depois por ordem hierárquica (afinal aquilo era um quartel), até a outra cabeceira, onde sentavam os piás, pobres piás. Tudo começava com o retumbo de sua voz: "Na mesa se come, na sala se conversa e na cama se dorme". Vai dormir com um barulho destes! Ninguém podia abrir o bico, principalmente os piás, algum mais velho ainda passava. Cozinheira e camareira tinha "às pampas", mas o serviço na mesa era também por ordem hierárquica, e quando a costela chegava no prato dos piás, já estava fria. E naquele silêncio sepulcral, o piá não tinha como se socorrer da "mamãe", era tudo com ele, naquele garfo e faca tão grandes. As refeições eram demoradas, num ritual salutar e de respeito, numa mesa que nunca baixava de quinze pessoas. Quando então numa mesa de café - mas isto é assunto para o próximo boletim.

GALPÃO.
Matutei no Galpão do Galo Velho.
Uma madrugada muito fria, como só o gaúcho sabe apreciar o frio, fez aproximar meu banco pra perto do fogo forte, sorvendo o amargo do meu mate e soltando o pensamento, na várzea do passado. O silêncio bom me envolveu, e são momentos em que a gente se sente solto, como no lombo do cavalo, galopando ao vento. Então um pressentimento me disse que não estava só, e que um diálogo flutuava no ar, na busca de uma aproximação. Tantos que se foram, que fica difícil uma identificação, mas fica a paz e o sentimento bom da calma, que compassou o bater do meu coração. É preciso amar. Não só o meu próximo conhecido, mas até mesmo aqueles que me foram desconhecidos, e que partiram, estando no aguardo de um breve encontro.

HISTÓRIAS QUE ME CONTARAM.
O Cel. Ney Xavier Azambuja.
O sobrenome Azambuja, provém da vila de Azambuja, em Portugal, que é cabeça de conselho, localizada no distrito e patriarcado de Lisboa, pertencendo à comarca de Cartaseo. Era abundante na região uma árvore de boa madeira, chamada de "zambujo".
O Cel. Ney descende desta tradicional família, e nasceu na Fazenda da Invernada no dia 25 de agosto de 1865, filho de Ignácio Xavier de Azambuja e de Marcolina de Jesus Centeno. Era ainda tataraneto do capitão Francisco Xavier de Azambuja e de Rita de Menezes, que era filha de Jerônimo de Ornelas Menezes e Vasconcelos, proprietários da sesmaria que deu origem a Porto Alegre.
Casou o Cel. Ney em primeiras núpcias com Faustina Centeno Pereira da Silva, proprietária da Fazenda da Quinta, pois era irmã de Adolfo Luiz Pereira da Silva. Deste casamento surgiram 13 filhos, mas só oito sobreviveram - Mário, casado com a prima Thereza; Marieta, casada com José Olavo Fay; Mariá, casada com Tito Paranhos; Lauro, casado com a prima Maria; Ney Filho, casado com Nilda Souza; Dário, casado com Lourdes Vilamil; Marcolina, casada com Romeu Luiz Pereira da Silva, e Adolfo, casado com Zilda Souza. O Cel. Ney teve como irmãos - Estácio, radicado em Bagé e seu companheiro de revolução, Amália, Palmira, Caio, Cândido, Nelson, Hipólita, José e Marcolino. (aquela gente não tinha outra coisa que fazer...)

FECHANDO A PORTEIRA.
Ainda a Fazenda da Invernada.
Pois ao voltar ao passado tão distante, fico buscando conclusões, do que ficou plantado dentro de mim, com aquela educação tão rígida. O velho austero, rude, azedo, e as vezes mal educado caudilho, Cel. Ney Xavier Azambuja, era um homem de escondida ternura. Afirmo isto porque quando das nossas despedidas, a emoção tomava conta daquele homem duro, e as lágrimas escorriam pelo enrugado de sua face, e mesmo sem ofertar um beijo ou um abraço, externava a dor da partida, por aqueles a quem amava. Então se hoje cultivo a virtude da humildade, do respeito e da ordem, tenho de agradecer aos momentos difíceis de uma infância, passada ao lado daquele caudilho, que não aprendi a amar, ou não me deixou amá-lo. Resta o reconhecimento de gratidão.

sábado, 21 de agosto de 2010

Boletim 49

ABRINDO A PORTEIRA.
Fazenda da Invernada - 1ª - "Sala de visitas".
Um passeio lá por 1940, quando eu teria meus sete anos. A sala enorme, que só era enorme para as crianças como eu, era local dos "serões" da grande família, pois meu avô Cel. Ney Xavier Azambuja fizera treze filhos na bendita Vovó Faustina, que não cheguei a conhecer, já que aquela gente morria muito cedo, ainda mais dando tanta cria. Então o velho caudilho, que nem era tão velho assim, só para os olhos da criança que habitava em mim, após o jantar sentava "patronalmente" num canto, e na sua esquerda os sofás de couro abrigavam os filhos e pessoas mais velhas, enquanto na direita, algumas cadeiras duras abrigavam os vários piás como eu. "Sentem aqui, para ouvirem os mais velhos falarem, e aprenderem alguma coisa" era a voz dura do tirano. Ora Santo Deus, o velho cometer aquela heresia, justamente naquela noite de luar, com o açude ali pertinho, pedindo uma pescaria, e a gurizada naquela imobilidade, ouvindo histórias, que hoje lamento não ter escutado. As mulheres tinham sua roda no outro canto da sala, tricotando e falando da vida alheia como ainda hoje o fazem, ouvindo o velho caudilho dizer - "as criança menores tem de ir para a cama, pois esta é a hora de vocês descansarem". Um baita conselho, mas tinha criança menor, que não era menor, e não costumava dormir àquela hora, mas Deus o livre, como contrariar aquele azedume! Bueno, o que vocês tinham de assistir era o ocorrido na mesa de refeições, mas isto é história para o próximo boletim.

GALPÃO.
Ainda a reforma.
As coisas demoradas é que são boas. Olhem só aqueles namoros compridos, as longas refeições, e os passeios com as rédeas no chão, mas principalmente a "longa vida", quando se tem boa visão de um horizonte grande, que ficou para trás. Então, a reforma do Galpão do Galo Velho por demorada está linda de viver. Lembram quando contei que "entrou luz no galpão"? Pois outro dia me dei conta que a luz continua a entrar no galpão. O Luis Mário colocou algumas telhas de plástico transparente no teto novo, e a luz, que foi deus no antigo Egito, purifica o chão, esparramando o brilho do Sol e das estrelas celestes. Vocês verão. No verão.

HISTÓRIAS QUE ME CONTARAM.
Caminheiro - O amigo João Moacir Ferreira(jmoacir@viavale.com.br) é o autor dessa história.
Seria um baile qualquer. No interior, era assim, bem perto da estrebaria, retirava-se o milho, formava-se uma sala e com o espargir das gotas de velas de cera, as tábuas ficavam cada vez mais lisas. O Gaiteiro um mulato preguiçoso, num canto, dormia sobre o teclado de uma gaita piana. Lá longe, no vivenciar caprichoso da serra, um cachorro disfarçado de gente, uivava para sentir o seu latido, vibrar entre os montes.
Foi quando Ela entrou salão adentro, viva, lépida, faceira. E eu com um jeito de cachorro desconfiado, fui a seu encontro, mais tarde, agarrado a sua cintura, conduzia a leveza daquele vestido de chita, sonhando um dia, tê-la para mim, eternamente minha.
Foi quando o Mulato Juvêncio gritou para o salão inteiro:
- Marca das Damas Pessoal! Separem-se os pares. Os homens para um lado e as mulheres para o outro!
Cada taura foi-se, então para um canto. Silêncio geral no salão. Um cachorro sardento e magro, adentrou no salão e saiu-se esganiçando porta a fora, atiçado por uma ponta de bota. E eu ali, olhando aquela pinguancha, mais ao lado, linda e maravilhosa, separado dela, eu sabia, mas por apenas alguns momentos. Sabia eu, que seria sua escolha, naquela Marca das Damas. E foi o sanfoneiro, abrir a gaita que lá veio ela, linda faceira... uma deusa! Mas, de repente, não sei como foi, ela passou por mim e foi-se com outro... que a levou em seus braços. Estava ainda mais linda! E eu ali quedei-me a um canto, sentindo o fel amargo do desengano. Saí, porta a fora, escutando o farfalhar ainda das saias rendadas, rodando pelo salão.
E eu, parti noite adentro, sem saber onde ir.
Por isso, sou o que sou, até hoje, um caminheiro de destino incerto!

FECHANDO A PORTEIRA.
O Cérebro e a Mente.
Certamente não seria eu a pessoa abalizada para escrever este artigo. Ele deve ser escrito por meu primo, Ney Artur Azambuja, que lida diariamente com um cérebro aberto, vencendo a morte, mas se apoiando além da sua habilidade médica, na força de vida que ali habita, origem de nossas existências. "No princípio era o verbo, e o verbo era Deus" está lá nas Escrituras Sagradas, portanto, o Supremo Criador habita no centro da palavra, localizada em algum lugar do cérebro, que só o Ney Artur sabe. Gostaria de conhecer mais, comunicar mais, mas minha ignorância me obriga a calar. Fica a mensagem, para que alguém me conteste, ou me ajude, já que desejo minha mente limpa e pura, quando chegar a hora de "um até breve" para vocês todos.

domingo, 15 de agosto de 2010

Boletim 48

ABRINDO A PORTEIRA.
As suposições.
Outro dia prestei atenção no diálogo de dois amigos, quando por mais de dez minutos de conversa, só fizeram suposições. Nossa imaginação é fantástica, capaz de nos levar ao infinito dos pensamentos. Nossas mentes são incomensuráveis, e é fácil supor o que se passa com quem está envolvido em problemas. Os dois amigos ficaram "novelando" a vida de um outro conhecido, apenas fazendo suposições. Não chegaram em lugar algum, perdendo tempo e na maioria das vezes fazendo injustiças, com aquele que não conseguia resolver seu problema. Assim acontece com as criaturas, que nada tendo o que fazer, ficam "falando da vila alheia", sem embasamento algum, e sem nada de concreto no pensamento, apenas supondo... Vamos fixar nossas mentes nas coisas positivas, reais, e vamos buscar a verdade a cada instante, no encontro final com Deus.

GALPÃO.
Sexta feira treze de agosto!
Pois foi nesta bela noite, que o Galpão do Galo Velho enfeitou seu "etéreo", com as boas emanações das mentes sadias de meu irmão, primo José Vitor Centeno Rodrigues e sua esposa Helena Maria. Ao som da afinada corda prima de seu violão, ele cantou e encantou duas horas daquela noite fria, iluminada pelas labaredas do forte fogo, alimentado pela Helena Maria. O galpão ainda no osso de uma grande reforma, que o meu Castiano promove, já relatada no boletim anterior, se alegrou e despertou os negros velhos, que ali dormem a noite grande da Invernada do Esquecimento. Momentos como este são os que gosto de gravar, para aqueles que virão depois, no registro de uma história que ali não terá fim.
Que o Grande Arquiteto do Universo ilumine o caminho destes meus dois primos, não permitindo que se percam nas encruzilhadas da vida, e que tenham Saúde, Saúde, Saúde.
São as preces do Galpão do Galo Velho.

HISTÓRIAS QUE ME CONTARAM.
Uma conversa com o Galo Velho, muito tempo atrás.
-Galo Velho tu és feliz?
-Sou feliz. Tenho uma boa companheira, um rancho limpo e honesto e não me falta comida.
-Mas não te falta mais nada?
-A felicidade nunca será completa. Sei que me falta muito, como sei que para o Patrão também falta. Primeiro tenho que reconhecer o muito que Deus me deu, principalmente a saúde. Sei que me falta um colchão novo, destes de mola que recém inventaram, mas tenho que me contentar com aquele de crina, feitio da Dona Selvina. Nem gosto de pensar no tal de rádio, com aquela voz linda, saindo de dentro daquela caixinha.
-Então estás feliz.
-Sim, e minha maior felicidade é apreciar a natureza sorrindo, ao nascer de cada madrugada, me sentindo solto no lombo do picaço campo à fora, quando me sinto dono de alguma coisa deste mundo grande. Não sei fazer conta menino, nem medir o tamanho das coisas, mas sei que dentro de mim existe um espaço imenso, como se um Construtor ali fizesse a sua morada. Sou feliz sim, principalmente por saber viver em paz com as outras pessoas, e se fosse um solitário, sem minha china, meu cavalo e meus amigos, seria então um homem muito infeliz.

FECHANDO A PORTEIRA.
Inverno brabo.
Em outro boletim do ano passado creio que fiz a mesmo consideração - que inverno brabo! Estamos com frio desde maio, e que frio! Até uma ceroula minha Jane comprou para me aquentar por baixo, e minha prima Ivette confeccionou na lã do tricot, umas polainas para aquecer minhas canelas. A bicharada anda quieta, e até o Atropelo, "cuiúdo" da manada do Luis Mário, anda relinchando baixo. Ainda não vi a geada, pois "larguei" das madrugadas, mas fico feliz ao relembrar de um tempo, que se cangava boi nas noites escuras delas, quando se quebrava geada nas poças d´água, e até no sereno da grama. Será que está voltando aquele outro tempo? Difícil, pois o tempo não dá volta, mas resta a alegria de que o Rio Grande do Sul desperta, "selecionando" os fortes e os bons, preparando ainda o terreno para a "sêmea" de uma lavoura livre das pragas e das doenças. "Inverno forte = lavoura forte", já diziam os nossos ancestrais.

terça-feira, 20 de julho de 2010

Boletim 47

ABRINDO A PORTEIRA.
A Reclamação.
Vamos primeiro identificar os propósitos destes boletins. Além da história de um tempo passado, princípios do meu NPHC, devemos pensar juntos nas coisas do nosso dia a dia. Hoje vamos refletir sobre RECLAMAÇÕES. Fico me questionando quantas faço por dia, e não consigo chegar numa conta, talvez vocês consigam. No trânsito então, quando estamos com o volante na mão, quantas fazemos? Será que estamos sempre com a razão? Então, com a esposa e os filhos, parece um desastre, onde muitas vezes não mostramos tolerância. Por falar em tolerância, quem admite opiniões divergentes? Depois de tantas interrogações vou fazer as minhas afirmações para não alongar, mas por favor, pensem nas de vocês. Só seremos educados, sábios, "velhos", quando aceitarmos as opiniões dos outros, mesmo que elas não nos convençam, sem tentar prevalecer as nossas. Até a opinião de nossos filhos que sabemos erradas, devem por vezes ser ouvidas em silêncio, para que possam refletir nos seus próprios erros, e mais tarde sim, tentarmos um diálogo amigável.
Confesso que uma de minhas práticas atuais (talvez das últimas) é não reclamar mais. Tudo aconteceu quando passei a ficar surdo, concordando com as pessoas e me tornando mais amável. Pensem nisto, o que só irá fazer bem ao nosso viver com Deus.

GALPÃO.
A reforma.
Vocês não irão acreditar. O Galpão do Galo Velho está "nos trinques", pois o Luis Mário se esmerou, superando a própria crise financeira. Um novo telhado de alumínio, leve, bonito e para sempre. Nova instalação elétrica, uma linda varanda, onde nos dias quentes teremos onde ficar, e no inverno servirá de estacionamente para nossos carros, descendo no seco quando das chuvas. A "alma" do galpão (pois quem não crê eu afirmo - galpão tem alma) continua a mesma na sua simplicidade, que é a essência das coisas verdadeiras. Faltam os cavaletes para os arreios, as cocheiras prontas para os cavalos do Ramiro e o pai Castiano, e por último a confecção de uma "parrilla", coisa de castelhano tchê.

HISTÓRIAS QUE ME CONTARAM.
O Zé Grande.
Nunca ninguém soube ao certo o seu verdadeiro nome. Um José qualquer, mas um negro muito grande, de gestos calmos e seguro em suas atitudes e, um homem de confiança da Fazenda da Quinta. Ele construiu ao lado do Galpão do Galo Velho um rancho de leivas, coberto de santa-fé, onde criou uma grande família ao casar com Sia Antônia, tendo um filho que foi meu amigo de infância, o Pedro, dos muitos negros meus amigos, e ainda hoje tem duas de suas filhas morando na Vila da Santa Rita do Sul. Uma delas a Lilica ajudou muito a criar com carinho, meus filhos por muitos anos. Além da característica de bom atirador, primava pela maneira de falar por ser "meia língua" trocando o "r" pelo "l". Nos dias de marcação era ele que manejava o monte de marcas junto do fogo, e quando gritavam: "Olha a marca marqueiro". Ele respondia "Apelta manheiro". Nos dias de festa era o homem do churrasco, assando na vala de chão, e quando era hora de servir dizia: "Ta plonto. Mais clu come o tigue e véve goldo" .

FECHANDO A PORTEIRA.
Ainda as reclamações.
Elas se confundem com impaciências e irritações. Por tal lembro de meu sogro e amigo Raul de Freitas Lima, que foi chefe do Correio e Telégrafos, quando dirigia mais de mil empregados da empresa. Pois se aposentou de uma quinta para uma sexta feira, sem um preparo psicológico, e foi um desastre total. Ficou dentro de casa azucrinando a família inteira. Eu era namorado da filha dele, a Jane, hoje minha esposa de 52 anos, imaginem quanto tempo faz. Lembro de certa feita estando na sala de visitas, lógico que com a sogra do lado "fiscalizando" o namoro, ele passou todo empertigado, e olhando para mim disse: "Luiz vou sair, pois tenho que dar uma bronca em alguém, e o primeiro certamente será o cobrador do bonde". Um verdadeiro crime premeditado, como dirão os juristas, mas testemunho que estes fatos ocorrem ainda hoje, e com frequência. Digam se não estou com razão.

sábado, 10 de julho de 2010

Boletim 46

ABRINDO A PORTEIRA.
A vida dos outros.
O que mais atrai a atenção na TV, e mesmo na vida real, é o que trata da vida dos outros. O que mais prende as pessoas são aqueles assuntos fortes, mais ainda os violentos. Tem um programa no canal 22 da Sky que só trata de fofocas, e certamente é o de maior audiência, focando a vida privada das pessoas, até mesmo batendo em seus quartos. Quando então se trata de um assassinato brutal, é um Deus nos acuda. Basta olharmos na mídia o caso do goleiro Bruno. Ninguém sabe quem é esta criatura aqui no Sul, mas já sabemos tudo de sua vida privada, e não olhamos para outra coisa. Mas por todos os profetas! Quando é que vamos cuidar de nossas próprias vidas? Certo que o exemplo dos outros nos dá referências de vida, mas será que só temos assassinos e desvirtuosos? Por toda esta projeção as pessoas passam a não temer a Deus, não respeitando seus mandamentos, e buscando nas suas vaidosas imagens, a telinha da TV. Pensem nisto, enquanto fico assustado com a força, mal aplicada, da mídia.


GALPÃO.
Ainda as marcações.
Sou do tempo de puxar por baixo do brete. Ainda não haviam inventado os tais de troncos, que aqui para nós, foi uma das melhores invenções para campo. Só quem lida com animais grandes, mesmo mansos, sabe que na hora da dor ninguém fica quieto. Pois nos troncos modernos não há como se "reborquear", e o serviço é feito tranquilamente. Agora imaginem a gente puxar por baixo do brete, já com uma pata laçada, e tironeada por um cavaleiro num pingo bom de cincha. Depois é claro, o bicho vem de arrasto, e é nesta hora que tem de se pegar na cabeça e torcê-la com força, quando então o cinchador se pára, esticando a pata laçada. Por ser o mais forte da fazenda sempre sobrava pra mim aquela pegada. Enfiava os dedos nas ventas do terneiro, segurava das orelhas, já que ainda não tinham guampas, e torcia o pescoço com força. Então chegava meu Pai com sua faca afiada para a castração, sendo macho claro. Um talho nos dois "bagos", puxava o primeiro e cortava o "tendão" lá no fundo. Depois o mesmo no outro. Colocava tudo num balde para depois ser jogado nas brasas, e após passado numa caneca com sal. Virgem, que saudade de um tempo que não voltará mais. Na noite, lá no Galpão do Galo Velho, vinha o prato "ovos com ovos". Virgem! a gente trepava até em poste.

HISTÓRIAS QUE ME CONTARAM.
Histórias contadas pelo Galo Velho:
"Já contei que é difícil acreditar no que estes olhos velhos viram. Creiam. Foi um tempo em que havia muito respeito, e também muita Paz, a Paz interior. Esta placa que vocês colocaram aqui no Galpão é muito bonita - "Paz e Respeito" - e não paro de olhar para ela, pois fala do tempo em que fui muito feliz. Nada havia além da fazenda. A vila era muito distante, por não haver estradas nem conduções para se chegar nela. Tudo era a cavalo, quando muito em carroças. Então só tínhamos o trabalho e a família. A gente sabia que todo santo dia iria chegar nela, girando o mundo ao redor da esposa, dos filhos, dos pais e de nossos poucos avós, pois morríamos muito cedo. Não tínhamos outra coisa que não a família, nosso único pensamento dia e noite, além do serviço.
O que vocês me dizem dos dias de agora? Vocês têm tempo de brincar com os filhos ou netos? Conseguem armar uma pandorga e lançá-la no espaço, ou um barquinho de papel jogando-o n`água, acompanhando a alegria da criança? Tempo para ensinar o menino a iscar um anzol e atirá-lo no açude, na fisgada firme de um peixe? Se o mundo está egoísta é porque vocês não tem tempo para o próprio bem estar, que dirá para suas família. No meu tempo elas não se desmanchavam como agora. E os amigos? Hoje só um bom dia ou boa tarde, e os encontros nos velórios ou casamentos. No meu tempo se mateava longo, numa charla sem fim. Verdade que as opções eram poucas, mas afirmo: "criávamos os filhos, e alimentávamos as amizades, com mais amor e respeito.
Desculpa meu filho, se não contei uma história, apenas um fato".

FECHANDO A PORTEIRA.
Ainda dos outros...
Dizem que os artistas ou celebridades são pessoas públicas, e não devem se esconder, ou até se revoltarem com os "paparazzos", que passam dias a fio catando suas imagens. Então, quando há um escândalo com eles, é a glória. Particularmente entendo que eles são pessoas normais, como todos nós, apenas com uma habilidade própria e desenvolvida "a custa da mídia", que então tem "direito" de lhes cobrar cachê. Tudo nada mais é do que dinheiro, interesse, vaidades, nada mais que vaidades. Mais uma vez digo que a grandeza das pessoas está no seu interior, morada de Deus, e só com Ele poderemos desenvolver nossas virtudes.

terça-feira, 6 de julho de 2010

Boletim 45

ABRINDO A PORTEIRA.
Dá vontade de não ter.
Quando meu computador começou a dar problema, senti vontade de nunca tê-lo comprado. Claro que é rebeldia de velho, que viveu um tempo de calmaria, quando não havia nem mesmo rádio. Nada estragava, não havia máquinas, se andava de jardineira e carroça, e na maioria das vezes à cavalo, com um horizonte sem fim na frente da gente. Desculpem vocês de hoje, mas ontem era mais legal! O tempo não corria como agora, as coisas custavam a acontecer, até mesmo um pouco monótono, mas se vivia "mais largo". Então, quando a gente se compromete com o computador, com mensagens recebidas e expedidas, com blogs por fazer, e-mails engasgados, boletins parados, o face book sem contato, a gente se dana, e tem vontade de não ter computador. Será que vocês estão pensando: "dá vontade de não ter carro; não ter TV; máquina de lavar; barbeador elétrico; forno; ar condicionado; roupa - voltando à selvageria... Epa! Já é demais. Apaguem minha rebeldia. Sabem, deixem as máquinas estragarem. Retifico: o tempo atual é muito, mas muito mais legal. Vamos viver cuidando da saúde e da família.

GALPÃO.
A reforma.
Coisa velha o bom mesmo é jogar no chão e fazer tudo de novo. Pois três meses após o começo da reforma, o Galpão do Galo Velho continua em reforma. Nem luz tem, só a do fogo de chão que não apaga nunca, o que para mim basta. Fica até um ambiente elevado, quando a gente se ilumina pelas fortes labaredas de velhos troncos plantados por Papai e Mamãe. Espiritualmente a presença deles fica mais forte, e a gente mentaliza o etéreo, revive o passado e se purifica das mazelas do Mundo Moderno.

HISTÓRIAS QUE ME CONTARAM.
Histórias de galpão, contadas pelo Galo Velho.
"Creio que vocês não entenderão meu tempo. Será necessário viajar muito para trás. Um tempo difícil em que tudo era na força do braço. Hoje vocês manejam a vida por botões. Então, fiquem aqui junto do meu cavalete, olhando encilhar meu picaço. Xergão, carona, bastos, travessão com a cincha, um apertão no látego, os pelegos e um apertinho na sobre-cincha. Depois de colocar o laço, aperto as esporas nas velhas botas, presente do Patrão. Pego do mango, o meu bom chapelão de feltro, e confirmo a faca afiada. A barra do dia mal desponta, e já montado me paro esperando pelos companheiros.
A coisa só começa com a chegada do Patrão Mário, bem aperado no colorado Bico Branco, e depois da saudação, grita: "Zé Grande, tá com o mosquetão e as balas?" Eu sei que aquilo não é para pelear, pois a revolução já terminou há quatro anos, lá em 1932, quando os Patrões amarraram os cavalos num tal de obelisco, no Rio de Janeiro na última revolução à cavalo. Sei que é para limpar campo!
Explico: Cavalo já não vale mais nada, e a eguada é muito grande, mais de 500, não existindo negócio para elas. O boi passou a valer alguma plata e a vacagem tem aumentado muito nos últimos tempos. Então toca de limpar campo à bala de mosquete. "Zé Grande, aquela é velha, esta não presta, aquele é aporreado, aquele outro é velho demais. ". Zé Grande não erra tiro, e a corvalhada fica mais faceira que ganso em taipa de açude. Sei que é difícil de vocês crerem, mas eu testemunhei este fato.


FECHANDO A PORTEIRA.
O Computador.
Depois de execrar o danado lá na Abertura da Porteira, venho novamente com ele. Meu filho Júnior me passou um e-mail com o anexo de Porto Alegre Antiga, o qual já havia assistido, mandado por ele mesmo. Ao abri-lo chamei a Jane para perto, e ela deu as costas dizendo que já o assistira. Alimentei minha emoção, revendo tudo outra vez até o fim, pois ali vivi a felicidade de muitos anos de minha juventude. Relatei este fato a ele num outro e-mail, e recebi com resposta, que sua esposa Márcia havia agido da mesma maneira que a Jane. Tirei como conclusão que elas sentem um profundo ciúme de nossas máquinas, e não gostam nem de chegar perto. Será que estarei errado? Primeiro devemos confessar nossa culpa em dedicar tempo demais à eles, e creio que isto é universal. Então devemos buscar o equilíbrio. Pensem nisto.

domingo, 13 de junho de 2010

Boletim 44

ABRINDO A PORTEIRA.
A criatividade
De um e-mail retirei a frase: "criatividade caminha junto com a falta de grana". Quem pode dar testemunho deste fato? Dou o meu: "quando tinha grana, minha única criatividade era conseguir mais grana". Não sabia fazer mais nada além de ganhar dinheiro, e o pior é que perdi quase tudo com esta minha falta de criatividade. Lembro de certa feita dizer numa roda de amigos - "não será sob um guarda sol em uma praia paradisíaca, com uma cerveja gelada na mão, que irei criar alguma coisa". Ninguém irá contestar esta verdade. Poderei descansar o corpo, já que o espírito não cansa, mas não estarei criando nada, absolutamente nada. Por tal, hoje me sinto mais criativo, com tempo para sentar nesta máquina e escrever para vocês, alguma coisa que dê o que pensar. Criem, para a Verdade interior que habita em cada um de nós.

GALPÃO
Ainda as marcações.
Naquele outro tempo, "quando se amarrava cachorro com linguiça", lembro das marcações na Fazenda da Invernada, de meu avô Ney Xavier de Azambuja. Aquele gado era pouco sadio, pois nossos campos ficavam alagados inverno e verão, e as enchentes levava dois ou três meses para escoar. Percebam que o Arroio Duro desaguava no Banhado do Colégio, que não tendo os drenos do DNOS, hoje AUD, levava muito tempo para fluír nas várias sangas - Jacaré, Santa Rita, Estacada, Peixe e outras. Assim o gado era atacado por parasitoses, e principalmente pela tuberculose. Mas vamos para as marcações, que já me referi no anterior. O peão patieiro levava um carro de mão cheio de marcas para a mangueira, e com ele um monte de gente, pois as fazendas eram muito habitadas, e a vila não. Tinha marca para todo mundo. Os posteiros não existiam mais, entretanto, ainda possuíam suas marcas, no pouco gado que criavam. As crianças tinham marcas, a segunda esposa, Doralice, também possuía a sua, e o Tio Nelson, irmão do Vovô Ney também possuía as suas, sendo sócio e vizinho da Invernada. Tinham que ver o fogaréu e o atrapalho do pobre do marqueiro, que levava gritos pelos ouvidos a toda hora. Dá para lamentar não terem ainda inventado a filmadora, para registrar o momento.

HISTÓRIAS QUE ME CONTARAM.
Uma plantação de arroz.
Certamente uma das primeiras da Fazenda da Quinta, junto a sanga dos Capõezinhos, também conhecida como Capão do Trago. Meu tio Lauro Azambuja ali foi morar numa simples casa de madeira, quando casou com a prima Maria Centeno Pereira da Silva, uma das herdeiras da fazenda. Meu pai, Mário era o tratorista, pois na época só dirigia veículo quem tivesse carteira de motorista, o que era um fato raro na região. Lavrando com aquele trator Fordson, que hoje enfeita a Fortral, tracionava um arado de duas aivecas, quando notou o cunhado José Olavo Fay se aproximando e sentando numa valeta, pensativo. Meu pai longo pensou, "o Fay vai aprontar alguma". Não deu outra, pouco tempo depois pediu que Papai parasse o trator, o que era um sofrimento sendo tudo na manivela. Foi logo perguntando, em que marcha estava lavrando, no que foi respondido que numa segunda. Tio Fay continuou: "noto que está sobrando força no trator não é Mário?". "Acho que sim" foi a resposta. "Então Mário vamos colocar uma grade atrás do arado, assim o terreno já fica mais preparado". No que Papai respondeu: "E eu vou colocar um banquinho em cima da grade, e tu já vai semeando. Tá certo?". Pois não é que cinquenta anos passado a tal máquina existe? Ela se chama Cantoni, é italiana e se funciona não sei. Meu tio Fay era um homem muito criativo e inteligente. Ele que inventou as histórias das teimosias dos Azambujas, que já escrevi em boletins anteriores.

FECHANDO A PORTEIRA.
A cremação.
Só quem assistiu para entender o momento solene. Confesso que ao me despedir de um sobrinho da minha Jane fiquei surpreso. Claro que tudo depende da compostura dos familiares, e quero testemunhar a evolução do homem, ao lembrar de um tempo que vivi, quando a morte não era aceita. A cremação foi de um jovem de apenas 35 anos, pessoa serena, tranquila, querida, e não é por ter morrido não. Quem o conheceu testemunha seu carisma. O fato ocorreu numa sala que mais parecia um anfiteatro, em formato meio círculo, com o esquife no centro, e o morto a descoberto. Um padre faz a prece de despedida, o que também é importante pela eloquência e sentimento cristão manifestado. Depois, dois ou três amigos fazem suas despedidas, também curtas e sentidas. O padre pede aos familiares que se aproximem do esquife para a despedida final. Uma música suave enternece os sentimentos de quem sofre. O esquife é fechado, e um sistema de roldana o conduz ao fundo, onde uma parede se abre para recebê-lo. A parede se fecha, e tudo termina. Perguntei como era a conclusão do ato, se tudo era queimado. Disseram que não, que o caixão era devolvido à funerária, as roupas e os objetos particulares devolvidos aos familiares, e que apenas o corpo era queimado e depositado suas cinzas em uma urna. É preciso viver para apreciar a evolução da humanidade.

quinta-feira, 6 de maio de 2010

Boletim 43

ABRINDO A PORTEIRA.
A Prioridade.
Quando o tempo em nossas vidas mostra que já navegamos bastante, temos de optar por uma prioridade, assim como o navio na busca de um porto para seu destino. Qual a nossa prioridade? Muitos esconderão a resposta evidente - o dinheiro. Basta olhar à nossa volta, verificando o afã dos viventes nas suas correrias estressantes, no seus nervos à flor da pele, nas suas irritações e impaciências, para respondermos sem medo de errar, que é o dinheiro. Minha experiência de vida diz, que quanto mais o temos mais o queremos, e quanto mais o ganhamos mais o gastamos. Vamos ultrapassar os desgastados termos - ambição e ganância - e vamos olhar para dentro de nós mesmos, na busca de sabermos utilizar o tempo que ganhamos de Deus, naquilo que nos dá prazer. Ter prazer é um bom negócio, não é mesmo? Já estou cansado de ouvir dizer que trabalho dá prazer. Vou declinar as minhas prioridades - saúde e família. Pensem nas de vocês.

O GALPÃO.
A Marcação.
Não vou me reportar as marcações campo à fora, ou de rodeios, porque não as conheci, apenas ouvi contar. Vou falar das marcações de mangueira, sempre no mês de maio, mas de um tempo em que não haviam inventado os tais bretes. Mangueiras grandes e de pau à pique, com uma só porteira de varas de correr, onde se penduravam couros vacuns para "espantar". Depois do gado emangueirado se formava duas filas de campeiros, a direita e a esquerda da porteira, ficando os guris e os mais maturrangos logo na saída, enquanto os verdadeiros pealadores ficavam mais distantes, pois por eles nada passava. Dois peões entravam a cavalo na mangueira e soltavam os terneiros, um a um é lógico, e olha que eles eram taludos, pois até mesmo de sobre-ano acontecia, por terem escapado da marcação anterior. Derrubado com o pealo, um dos mais fortes pegava da cabeça que era torcida, outro apertava o vazio com o joelho, enquanto outro colocava um laço na pata e esticava. Vinha logo o grito: "Olha a marca marqueiro!" Enquanto ela chegava, aquele que apertava o vazio castrava, se fosse macho, outro assinalava na orelha e aparava a cola. Se a marca não estivesse quente, o marqueiro gritava: "Aperta manheiro". Isto porque marca em brasa não precisa ser apertada. Cenas que assisti criança na Fazenda da Invernada, de meu Avô Ney Xavier de Azambuja.

HISTÓRIAS QUE ME CONTARAM.
O campeiro que era "deus".
Certo dia um pobre e ignorante homem cortava o galho de uma árvore, mas estava sentado na parte que cortava. Passava por ali um gaúcho bem pilchado, montado num lindo cavalo zaino, e vendo a cena disse para o homem: "Olha meu amigo, o senhor irá cair quando cortar o galho". O infeliz do homem deu risada e não ligou para o aviso, continuando seu serviço, enquanto o gaúcho ia embora. Algum tempo depois, cortado o galho o pobre do homem se espatifou no chão, dizendo logo a seguir: "Aquele homem é deus", saindo ao seu encalço montado num burrinho. Chegando nele foi logo dizendo: "O senhor é deus, e vai me dizer quando é que vou morrer", ao que o gaúcho respondeu que não era deus coisa nenhuma, e que lhe deixasse em paz. Entretanto, o pobre e ignorante homem insistiu tanto e tanto, que o gaúcho para se ver livre disse que ele morreria, quando o seu burrinho desse o terceiro "pum". O infeliz montou no burro todo assustado, e se tocou para casa, e no caminho o burrinho deu o primeiro "pum", e ele gritou: "Ai, ai, ai, que só falta dois". E bateu na marca, com pressa de chegar, mas quanto mais trotava mais sacudia a barriga do burro, e saiu o segundo "pum". "Ai, ai, ai que só que falta um". Bateu mais na marca louco para chegar em casa, mas correndo aconteceu o terceiro "pum", e o pobre do homem se foi ao chão como morto. Passavam quatro gaúchos, e achando o homem "morto" o estenderam sobre um poncho, pegando nas quatro pontas, e seguiram caminho. Chegaram num rio que não dava vau, pois havia chovido muito, e passaram a discutir onde era o passo. Um é por aqui, outro é mais àcima e se formou uma discussão. Foi quando o "morto" gritou do poncho: "No tempo que eu era vivo o passo era mais pra baixo". Foi um bruto susto ao ouvir o "morto" falar, quando o soltaram dentro d´água, que foi levado pela correnteza, e não se sabe se se salvou ou não. A lição é para as crianças estudarem bastante, e não ficarem burras e ignorantes como aquele infeliz e pobre homem.

FECHANDO A PORTEIRA.
O excepcional.
Não vou tratá-lo como substantivo, simplesmente vou adjetivá-lo como tão bem define o dicionário = "extraordinário, muito bom, excelente". Mas, ele é um excepcional. Não sei seu nome, nunca falei com ele, o conhecendo só de vista. Mas como é agradável vê-lo. Tenho vontade de parar o carro para cumprimentá-lo, olhar sua fisionomia que deve ser serena e boa. Ele está sempre à margem da Federal BR 116, a direita quem vai à Porto Alegre, naquela lomba que dá acesso à Araçá, e o que me encanta são os seus abanos para todos nós, indistintamente quem sejamos. É um cumprimento de amor, é um desejo de paz, é um afago de coração. Que Deus lhe abençoe, e lhe dê em dobro tudo o que nos oferta de amor.

Galo Velho

Camaquã, Rio Grande do Sul, Brazil
Fundado em 05/07/1980, assim foi escrito em sua 1ª página do 1º Livro: “O que importa neste GALPÃO é que cada um saiba ser irmão do outro. Aqui terminou o patrão e o empregado; o pobre e o rico, o branco e o preto; o burro e o inteligente; o culto e o ignorante. Aqui é a INVERNADA DA AMIZADE e tem calor humano como tem calor de fogo. Nosso Galpão nem porta têm, está sempre aberto para quem buscar um abrigo. Neste Galpão os corpos cansados da lida diária encontrarão sempre um banco para descansar, e um mate amargo para a sede matar. Aqui o frio do Minuano não encontra morada, temos toda a Sant’Anna irmanada. A cada nascer de uma madrugada há de encontrar alguém aquentando fogo, buscando nas cinzas do passado, o Galo Velho que será, quando partir para a Invernada do Esquecimento. Ninguém será esquecido, se passar nesta vida vivendo como o nosso “Galo Velho” viveu, a todos querendo, sem nunca ter o mal no coração.”