terça-feira, 21 de setembro de 2010

Boletim 52

ABRINDO A PORTEIRA.
Fazenda da Invernada - 4ª - "A roda do mate".
Vocês não fazem idéia de como se mateava naquele tempo. O primeiro deles era na madrugada, pois a gente deitava "com as galinhas". Sem luz, no escuro, nada o que fazer, além de filhos. Depois vinha o mate do "tira fome", às onze horas da manhã, e se o tempo estivesse ruim se mateava o dia inteiro, mas o mais disputado era o mate do "entardecer", quando a grande família se reunia na frente da casa, num pátio bem varrido, sob a ramada de uma figueira. O mate corria solto pela direita, servido pelo cevador, numa grande chaleira de ferro, com água fervendo. Fervendo mesmo, não há exagero, sou testemunha, pois "tocava" aos guris fazer a troca das chaleiras. Custei a descobrir o porquê - era para "espantar" as mulheres e os jovens da roda do mate! Machismo minha gente. Como havia machismo naquele tempo.

GALPÃO.
Ainda as conversas com o Galo Velho.
Recordo de uma conversa com o Galo Velho, quando perguntei da sua origem paraguaia.
"Meu pai era paraguaio. Eu nasci na Fazenda da Invernada, onde ele se juntou com uma querida negra de nome Maria, de quem eu nasci. Só sei contar o que ouvi dele nas rodas galponeiras, que eram histórias de tristezas. A gente sabe que se nosso tempo está difícil, o dele foi muito mais. Ele contava das muitas lutas, e do ódio tirano que reinava entre a gauchada da época, quando os homens mais se paravam no campo de batalha, do que junto de suas famílias. Então o assunto era como se morria, e como se matava. Meu pai veio como escravo para a Fazenda do Cristal, dos filhos do Gal. Bento Gonçalves, quando da tomada de Uruguaiana pelas tropas imperiais brasileiras. Sendo aprisionado ele passou a escravo do conquistador, como era hábito naquele tempo. Naquela luta ele perdeu a primeira mulher, que ali lhe acompanhara, e dizia que não tivera filhos com ela. Lembro que ele era um homem triste, mesmo tendo um patrão amigo como o Capitão Ignácio Xavier Azambuja, que o comprara dos Gonçalves. Agora parece que a vida está mais amena, as revoluções terminaram, e o ódio político chegando ao fim, permitindo que a gente atenda melhor o serviço e a família".

HISTÓRIAS QUE ME CONTARAM
O primeiro aramado de Camaquã.
Esta história me foi contada pelo Tio Dário Silva Azambuja, quando de uma visita que fez ao Galpão do Galo Velho. Procurei o registro do acontecido nos livros, mas ainda não encontrei. Sei que lá está gravado, já que os "causos" galponeiros, assim como as visitas, estão ali escritos. Bem, meu Tio Dário contou que o primeiro aramado que se tem notícias em Camaquã, foi na Fazenda da Flor da Praia, quando de propriedade do caudilho Gal. Zeca Netto. Não confundir com o Gal. José Antônio Netto, lá da Revolução Farroupilha e bageense, que era tio daquele. Estou falando do pai do Senhor Florisbelo Netto conhecido como Belinho, pai do José Cândido de Godoy Netto. Certamente mais uma bela fazenda sem história. Escrevam a história de vocês, não deixem as coisas morrerem! Mas voltemos ao tal aramado. Ele foi executado pelo cidadão Taborendengui. Receio errar até mesmo seu nome, que era de um capitalista, que "cruzou" por Camaquã, quando aqui foi sócio de Hildebrando José Centeno, numa grande charqueada, lá nas margens do Rio Camaquã, onde trabalhavam mais de quinhentos homens. Esta história também não está escrita. Contar história é uma coisa, outra coisa é escrever a história.

FECHANDO A PORTEIRA.
As intenções.
O título me faz reportar as orações, que a maioria dos cristãos, executa "nas intenções" aos seus santos favoritos. Por vezes são intenções ao Santo Antônio, o santo casamenteiro, dando vez a mil e uma intenções. Coitado do fiel. Fica rezando, na certeza que "alguém" está lhe ajudando, quando na verdade quem deve se ajudar é o próprio fiel. Não importa nossas intenções, o que importa são nossas ações. Recordo do meu tempo de jovem, quando ajoelhado junto ao Padre Walter Hanquet, confessava meus pecados: "padre pequei por pensamentos, obras e ações". Santo Deus de Misericórdia, quanto às minhas obras e ações eu sei responder por elas, mas meus pensamentos! Quanto pecado! Imperdoáveis, portanto, não mereço o céu. Pois ainda hoje, já velho, pratico "A Prova Quádrupla" do Rotary, onde está escrito: (do que pensamos, dizemos e fazemos) - 1º - É a Verdade? 2º - É Justo para todos os interessados? 3º - Criará Boa Vontade e Melhores Amizades? e, 4º Será Benéfico para todos os interessados? Bem, aí a coisa não é tão material, nos projetando ao terreno espiritual, mas aqueles meus pecados, "por pensamentos", eram materiais sim...

4 comentários:

  1. sempre um prazer ler (quase "escutar") meu querido Vô Careca! Defendo escrever a história, só agrego aos teus lindos escritos, um comentário: hoje se fotografa TUDO, já que há câmeras sempre à mão, nos celulares. Então, nossa história fica escrita e "ilustrada"! mas há que se colocar em álbuns, de papel mesmo, pois esta "tecnologia" é bem menos efêmera!
    Abraço e a benção!!! Ana Beatriz (Anamiss!!!)

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  2. Querida Anna Miss.
    Vai com dois "n" para ficares mais próxima da avó de Cristo. Confesso meu erro. Minha neta Fernanda não é a única. Ajuda. A finalidade destes boletins é melhorar, pois acabas de me dar uma idéia, vou colocar fotografias neles. Certamente isto irá melhorar.
    Beijo e abençoo teu coração.
    Vô Caleca.

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  3. É sempre bom ler tuas história, meu querido irmão.Estou atento a tudo que escreves, pois além de conhecer um pouco de história da região, pois não nasci aqui,aprendo muito com tua sabedoria. Todo o Sábio tem conhecimento, usa linguagem simples em transmitir este conhecimento e é sempre humilde. Parabéns meu Querido Irmão. Um grande abraço e que o Grande Arquiteto do Universo continue a iluminar tua mente.
    Alex Haas

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  4. Irmão Alex.
    Grato por tuas palavras, elas me incentivam à continuar minha busca pelo passado. As fazendas, assim como as entidades de classes não tem história. Podem até ter atas, mas história é outra coisa. Valeu. Abençoo teu coração limpo e puro.
    LFernando

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Galo Velho

Camaquã, Rio Grande do Sul, Brazil
Fundado em 05/07/1980, assim foi escrito em sua 1ª página do 1º Livro: “O que importa neste GALPÃO é que cada um saiba ser irmão do outro. Aqui terminou o patrão e o empregado; o pobre e o rico, o branco e o preto; o burro e o inteligente; o culto e o ignorante. Aqui é a INVERNADA DA AMIZADE e tem calor humano como tem calor de fogo. Nosso Galpão nem porta têm, está sempre aberto para quem buscar um abrigo. Neste Galpão os corpos cansados da lida diária encontrarão sempre um banco para descansar, e um mate amargo para a sede matar. Aqui o frio do Minuano não encontra morada, temos toda a Sant’Anna irmanada. A cada nascer de uma madrugada há de encontrar alguém aquentando fogo, buscando nas cinzas do passado, o Galo Velho que será, quando partir para a Invernada do Esquecimento. Ninguém será esquecido, se passar nesta vida vivendo como o nosso “Galo Velho” viveu, a todos querendo, sem nunca ter o mal no coração.”