quarta-feira, 17 de novembro de 2010

Boletim 59

ABRINDO A PORTEIRA.
Fazenda da Quinta - 6ª - O grande salto 2.
Então é necessário botar nossas imaginações a funcionar. Centenas de empregados foram contratados, numa época que não haviam leis sociais, contratos de trabalho, carteira profissional, insalubridade, e tudo mais que "complica" os dias de hoje no campo, pois as leis da cidade não foram adaptadas à ele. Imaginem a quantidade de "paseiros" cavando milhares e milhares de metros cúbicos. Depois era o plantio de 2.000 hectares de lavoura de arroz, e principalmente sua colheita, feita toda ela à foice, na força do braço humano. Adriano construiu "elementarmente" a primeira ceifadeira de arroz, e com o auxílio do Núcleo de Pesquisas Históricas de Camaquã, estou publicando sua foto abaixo, assim como os tratores à querosene, que com sua falta pela 2ª Grande Mundial, ele adaptou os "gazogênios", que pela combustão da lenha nos mesmos, acionava seus motores. Imaginem a mão de obra para construir, depósitos, casas, secadores, calhas e trapiches, numa época que não haviam máquinas como hoje, e o transporte do material era todo pela Lagoa dos Patos, pois também não haviam estradas.
Obs. = Para visualizar as fotos aumentem o zoom para 150.










Os tratores trabalhando com "gazogênio", e na outra, o Senhor Adriano, na sua "automotriz"

GAPÃO.
A igualdade e a cuia.
No Galpão do Galo Velho não existe patrão nem empregado, nem branco nem preto, nem pobre nem rico. Ali somos todos iguais, sem distinção, sem preconceitos sociais. Assim se comunga na mesma cuia de mate, "misturando salivas" como diz Apparício da Silva Rillo em uma de suas belas poesias - "Cuia".

Cuia morena queimada, confeccionada "a lo bruto",
rude cálice matuto das amarguentas comunhões.
Na tradição campechana, serves o vinho que irmana,
o dono da estância e os peões.

Velho utensílio crioulo, da utilidade nativa,
que misturando salivas, no ritual dos chimarrões,
estarreces gente estranha, que não sabe a campanha,
desconhece convenções.

E quando recebes em teu bojo, a erva pro chimarrão,
e da tua carnação, verde o sangue se desata,
me entristeço imaginando, que és um coração sangrando,
por uma artéria de prata.

HISTÓRIAS QUE ME CONTARAM.
"Esta eu conto para vocês".
Lembram que contei haver no arvoredo da Quinta, alguns pés de café e algodão. Não assisti suas colheitas, eles já eram improdutivos, mas ajudei a torrar café nos tachos de cobre, que depois eram "pilados", até ficarem "moidos". A banha era produzida nas fazendas, única gordura com que se cozinhava, além da "graxa dos tutanos", com que se fazia o feijão, o qual nunca podia ser requentado. O pão, as bolachas, as broas, e tudo o mais era produzido nas fazendas, para não falar na quantidade de gente para ser alimentada. Então, as fazendeiras levantavam de madrugada, e quando deitavam também não descansavam. Um mundo que vivi. Hoje vivo num outro mundo onde não tem mais fazendeiras. Lá elas ficam depressivas, com o nada por fazer. Tudo está pronto, e o que não está pronto, as máquinas aprontam. Mesmo, não tem mais gente nas fazendas, e se tem, eles que façam as suas comidas.

FECHANDO A PORTEIRA.
A riqueza e a felicidade.
Recebi e-mail de uma amiga, onde Max Gehringer se refere à livros e artigos, com receitas para se ficar rico, que contesta, inteligentemente. Relata que se não tivesse comido suas muitas pizzas, bebidos os milhares de cafezinhos, feito suas múltiplas viagens, comprado seus vários supérfluos, teria 500 mil reais em sua conta bancária, conluindo, que aquele dinheiro só serviria para fazer tudo o que fez, promovendo a sua felicidade. Não quero contestá-lo, quero adicionar minha vivência. Conheço centenas de amigos, que são imensamente felizes, e sequer conhecem Porto Alegre, nunca comeram pizzas, nem tomaram cafezinhos em balcões, ou compraram supérfluos. Felicidade consiste em amar a si próprio. Traduzo: "si próprio" é Deus.

Um comentário:

  1. Parabéns...
    Tua inspiração (a felicidade, a fazendeira, o visionário Adriano...)remete-me aos versos de Chico Buarque, em "Bom Conselho":
    ...
    Corro atrás do tempo
    Vim de não sei onde
    Devagar é que não se vai longe
    Eu semeio o vento
    Na minha cidade
    Vou pra rua e bebo a tempestade
    ...
    Um abraço
    Claudio

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Galo Velho

Camaquã, Rio Grande do Sul, Brazil
Fundado em 05/07/1980, assim foi escrito em sua 1ª página do 1º Livro: “O que importa neste GALPÃO é que cada um saiba ser irmão do outro. Aqui terminou o patrão e o empregado; o pobre e o rico, o branco e o preto; o burro e o inteligente; o culto e o ignorante. Aqui é a INVERNADA DA AMIZADE e tem calor humano como tem calor de fogo. Nosso Galpão nem porta têm, está sempre aberto para quem buscar um abrigo. Neste Galpão os corpos cansados da lida diária encontrarão sempre um banco para descansar, e um mate amargo para a sede matar. Aqui o frio do Minuano não encontra morada, temos toda a Sant’Anna irmanada. A cada nascer de uma madrugada há de encontrar alguém aquentando fogo, buscando nas cinzas do passado, o Galo Velho que será, quando partir para a Invernada do Esquecimento. Ninguém será esquecido, se passar nesta vida vivendo como o nosso “Galo Velho” viveu, a todos querendo, sem nunca ter o mal no coração.”