domingo, 13 de junho de 2010

Boletim 44

ABRINDO A PORTEIRA.
A criatividade
De um e-mail retirei a frase: "criatividade caminha junto com a falta de grana". Quem pode dar testemunho deste fato? Dou o meu: "quando tinha grana, minha única criatividade era conseguir mais grana". Não sabia fazer mais nada além de ganhar dinheiro, e o pior é que perdi quase tudo com esta minha falta de criatividade. Lembro de certa feita dizer numa roda de amigos - "não será sob um guarda sol em uma praia paradisíaca, com uma cerveja gelada na mão, que irei criar alguma coisa". Ninguém irá contestar esta verdade. Poderei descansar o corpo, já que o espírito não cansa, mas não estarei criando nada, absolutamente nada. Por tal, hoje me sinto mais criativo, com tempo para sentar nesta máquina e escrever para vocês, alguma coisa que dê o que pensar. Criem, para a Verdade interior que habita em cada um de nós.

GALPÃO
Ainda as marcações.
Naquele outro tempo, "quando se amarrava cachorro com linguiça", lembro das marcações na Fazenda da Invernada, de meu avô Ney Xavier de Azambuja. Aquele gado era pouco sadio, pois nossos campos ficavam alagados inverno e verão, e as enchentes levava dois ou três meses para escoar. Percebam que o Arroio Duro desaguava no Banhado do Colégio, que não tendo os drenos do DNOS, hoje AUD, levava muito tempo para fluír nas várias sangas - Jacaré, Santa Rita, Estacada, Peixe e outras. Assim o gado era atacado por parasitoses, e principalmente pela tuberculose. Mas vamos para as marcações, que já me referi no anterior. O peão patieiro levava um carro de mão cheio de marcas para a mangueira, e com ele um monte de gente, pois as fazendas eram muito habitadas, e a vila não. Tinha marca para todo mundo. Os posteiros não existiam mais, entretanto, ainda possuíam suas marcas, no pouco gado que criavam. As crianças tinham marcas, a segunda esposa, Doralice, também possuía a sua, e o Tio Nelson, irmão do Vovô Ney também possuía as suas, sendo sócio e vizinho da Invernada. Tinham que ver o fogaréu e o atrapalho do pobre do marqueiro, que levava gritos pelos ouvidos a toda hora. Dá para lamentar não terem ainda inventado a filmadora, para registrar o momento.

HISTÓRIAS QUE ME CONTARAM.
Uma plantação de arroz.
Certamente uma das primeiras da Fazenda da Quinta, junto a sanga dos Capõezinhos, também conhecida como Capão do Trago. Meu tio Lauro Azambuja ali foi morar numa simples casa de madeira, quando casou com a prima Maria Centeno Pereira da Silva, uma das herdeiras da fazenda. Meu pai, Mário era o tratorista, pois na época só dirigia veículo quem tivesse carteira de motorista, o que era um fato raro na região. Lavrando com aquele trator Fordson, que hoje enfeita a Fortral, tracionava um arado de duas aivecas, quando notou o cunhado José Olavo Fay se aproximando e sentando numa valeta, pensativo. Meu pai longo pensou, "o Fay vai aprontar alguma". Não deu outra, pouco tempo depois pediu que Papai parasse o trator, o que era um sofrimento sendo tudo na manivela. Foi logo perguntando, em que marcha estava lavrando, no que foi respondido que numa segunda. Tio Fay continuou: "noto que está sobrando força no trator não é Mário?". "Acho que sim" foi a resposta. "Então Mário vamos colocar uma grade atrás do arado, assim o terreno já fica mais preparado". No que Papai respondeu: "E eu vou colocar um banquinho em cima da grade, e tu já vai semeando. Tá certo?". Pois não é que cinquenta anos passado a tal máquina existe? Ela se chama Cantoni, é italiana e se funciona não sei. Meu tio Fay era um homem muito criativo e inteligente. Ele que inventou as histórias das teimosias dos Azambujas, que já escrevi em boletins anteriores.

FECHANDO A PORTEIRA.
A cremação.
Só quem assistiu para entender o momento solene. Confesso que ao me despedir de um sobrinho da minha Jane fiquei surpreso. Claro que tudo depende da compostura dos familiares, e quero testemunhar a evolução do homem, ao lembrar de um tempo que vivi, quando a morte não era aceita. A cremação foi de um jovem de apenas 35 anos, pessoa serena, tranquila, querida, e não é por ter morrido não. Quem o conheceu testemunha seu carisma. O fato ocorreu numa sala que mais parecia um anfiteatro, em formato meio círculo, com o esquife no centro, e o morto a descoberto. Um padre faz a prece de despedida, o que também é importante pela eloquência e sentimento cristão manifestado. Depois, dois ou três amigos fazem suas despedidas, também curtas e sentidas. O padre pede aos familiares que se aproximem do esquife para a despedida final. Uma música suave enternece os sentimentos de quem sofre. O esquife é fechado, e um sistema de roldana o conduz ao fundo, onde uma parede se abre para recebê-lo. A parede se fecha, e tudo termina. Perguntei como era a conclusão do ato, se tudo era queimado. Disseram que não, que o caixão era devolvido à funerária, as roupas e os objetos particulares devolvidos aos familiares, e que apenas o corpo era queimado e depositado suas cinzas em uma urna. É preciso viver para apreciar a evolução da humanidade.

5 comentários:

  1. Sabe minha Pichirica.
    Por minhas observações creio seres a única que lê estas minhas "mal traçadas linhas". Mas vou em frente, e não te ofendes com o que vou dizer: escrevo para mim, para o meu ego, ou qualquer outra coisa que habita em mim. Creio mesmo que se não escrever, morro.
    Beijo e abençoo teu coração.

    ResponderExcluir
  2. Mentira! Eu também leio, embora com menos freqüência, pois meus bolos e minha filha me tomam muito do tempo. AMOOOOO ler meu "padrinho" emprestado, e parece que estou no Galpão, sentada ao teu lado, ouvindo histórias! A Bênção, Vô Caleca! Beijo da Ana Beatriz

    ResponderExcluir
  3. Minha Ana Miss.
    Não há distância que nos separe. Estarei sempre presente em ti, com o amor que sempre te dediquei. Fico mais feliz em chegares para perto, lendo minhas mal traçadas. Faço força para que um passado não se acabe. Contarei ainda a história da Agropecuária Sant`Anna que tanto bem fez a tanta gente.
    Beijo e abençoo teu coração.
    Vô Caleca.

    ResponderExcluir
  4. Seu Fernando, meu pai era seu fã, eu muito novo, apenas ouvia ele sempre elogiar sua pessoa, Eu li todas as suas postagens, tbm passei a admirá-lo. Continue escrevendo e contando o nosso passado, só assim entenderemos nosso presente. Eu sou um admirador da história. Desejo-lhe muito sucesso e saúde!

    ResponderExcluir

Galo Velho

Camaquã, Rio Grande do Sul, Brazil
Fundado em 05/07/1980, assim foi escrito em sua 1ª página do 1º Livro: “O que importa neste GALPÃO é que cada um saiba ser irmão do outro. Aqui terminou o patrão e o empregado; o pobre e o rico, o branco e o preto; o burro e o inteligente; o culto e o ignorante. Aqui é a INVERNADA DA AMIZADE e tem calor humano como tem calor de fogo. Nosso Galpão nem porta têm, está sempre aberto para quem buscar um abrigo. Neste Galpão os corpos cansados da lida diária encontrarão sempre um banco para descansar, e um mate amargo para a sede matar. Aqui o frio do Minuano não encontra morada, temos toda a Sant’Anna irmanada. A cada nascer de uma madrugada há de encontrar alguém aquentando fogo, buscando nas cinzas do passado, o Galo Velho que será, quando partir para a Invernada do Esquecimento. Ninguém será esquecido, se passar nesta vida vivendo como o nosso “Galo Velho” viveu, a todos querendo, sem nunca ter o mal no coração.”